O presente estudo analisa a história das Olimpíadas e das Paraolimpíadas relacionando
seus desenvolvimentos com o advento da cobertura midiática, e correlaciona essas duas
modalidades de evento entre si. Por meio do estudo teórico e da observação dos dados
sobre a cobertura da mídia dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos tentamos comprovar a
diferença de tratamento dado a cada evento, reflexo de uma sociedade que se diz
inclusiva, mas que acaba se revelando discriminatória através da mídia.
Introdução
Este estudo tem como finalidade analisar a história das Olimpíadas e das
Paraolimpíadas relacionando seus desenvolvimentos a partir da cobertura midiática, e
correlacionar essas duas modalidades de evento entre si.
Os Jogos Olímpicos são um conjunto de provas esportivas de caráter mundial,
disputadas de quatro em quatro anos em cidades escolhidas; são, também “um
espetáculo filmado e divulgado pelas televisões”.
Esse também pode ser considerado o conceito de Paraolimpíadas, entretanto, há
diferenças. Os Jogos Olímpicos são divulgados intensamente, já a cobertura dos Jogos
Paraolímpicos fica restrita a pequenas notas na mídia, e a transmissão precária das
competições em alguns canais por assinatura.
Mostrar e analisar essa diferença entre a cobertura das Olimpíadas e das
Paraolimpíadas é um dos objetivos desta pesquisa. Assim como verificar a hipótese de
que os Jogos Olímpicos, ao contrário dos Jogos Paraolímpicos, tornaram-se espetáculos
pelo fato de que atletas transformam-se em mitos nacionais, enquanto paratletas
transformam-se em símbolos de superação.
Analisaremos de que forma a comunicação contribui para a inclusão ou a
exclusão dos deficientes, e mostraremos a importância da atuação do jornalista no
processo de desmistificação da deficiência, focando o trabalho na diferença de cobertura
jornalística das Olimpíadas e das Paraolimpíadas.
Olimpíadas, Paraolimpíadas e Sociedade
Nos anos de Olimpíadas e Paraolimpíadas, o mundo inteiro se rende aos
encantos e magia da abertura, dos diferentes esportes, da superação de tempo, espaço e
de limites. A mídia tem grande parcela de responsabilidade nesse fato, uma vez que por
trás do momento mágico olímpico estão as redes midiáticas e seus patrocinadores
exigindo reformas arquitetônicas, ditando regras, impondo horários e vestimenta. “Mas
o que se observa claramente é a tendência do ser humano em criar heróis, endeusar
pessoas, mitificar nomes”. Qual o papel da mídia nessa tarefa? O objetivo deste
trabalho é responder essa e outras questões.
A mídia auxilia o desenvolvimento de ambos os eventos, na medida em que
divulga as competições e os transforma em grandes espetáculos televisivos e
radiofônicos, principalmente; segundo Bourdieu “(...) a representação televisiva,
embora apareça como um simples registro, transforma a competição esportiva entre
atletas originários de todo o universo em um confronto entre campeões (...) de diferentes
nações”. Mas, os meios de comunicação também atuam como meios excludentes, “pelo
fato de que cada televisão nacional dá tanto espaço a um atleta ou a uma prática esportiva quanto mais eles forem capazes de satisfazer o orgulho nacional ou
nacionalista”.
Estamos numa sociedade dita inclusiva, mas na qual o preconceito para com o
deficiente é ainda muito grande. Segundo Claudia Werneck , “o preconceito da
sociedade em relação à deficiência se revela de inúmeras e discretas formas. O da mídia
também”. Os jornalistas têm dificuldade em falar no assunto.
Para Carlos Alberto Marques no deficiente está incutido o arquétipo da
incapacidade, sem que “se busque conhecer o potencial desse indivíduo”, assim, de
acordo com Ana Maria Morales Crespo “a mídia reflete uma imagem tão imprecisa e
incompleta – das pessoas com deficiência -, que torna impossível reconhecer-se nela”.
A diferença básica, que pretendemos mostrar, entre Olimpíadas e
Paraolimpíadas é a cobertura. Enquanto os Jogos Olímpicos são divulgados à exaustão,
os Jogos Paraolímpicos ficam relegados a uma ínfima cobertura jornalística, não
existem favoritos ao podium, nem mesmo depósito de confiança e esperança nas
atividades esportivas desses atletas. Aqueles que conseguem uma imagem positiva na
mídia, devido as suas vitórias, são tidos como símbolos de superação; de acordo com a
Coordenadora de comunicação do CPB, Gisliene Hesse, “a mídia ainda privilegia muito
a emoção nas matérias sobre atletas com deficiência e falta o jornalista entender que o
esporte paraolímpico é de alto rendimento” ; e à sociedade cabe “somente a função de
reconhecer e aplaudir o sucesso daqueles que teriam vencido as suas próprias
limitações”.
Isso porque há uma dificuldade de identificação e de projeção, por parte dos
telespectadores, com os atletas paraolímpicos, o que não ocorre com relação aos
olímpicos.
“(...) a cultura nacional, desde a escola, nos imerge nas experiências mítico-vividas
do passado, ligando-nos por relações de identificação e projeção aos heróis da
pátria, os quais também se identificam com o grande corpo invisível, mas vivo, que
através dos séculos de provações e vitórias assume a figura materna (a Mãe-Pátria,
a quem devemos amor) e paterna (o Estado, a quem devemos obediência)”.
A mídia faz com que as pessoas tenham compaixão por esses para-atletas, uma vez
que, segundo a imprensa, eles são “símbolos de superação”. Portadores de qualquer deficiência ou doença “devem ganhar não a solidariedade, mas o respeito e a confiança
da mídia”. Materiais jornalísticos sobre esse assunto não devem causar compaixão,
mas levar a uma reflexão.
Embora os atletas paraolímpicos “mostrem talento e coragem para enfrentar os
obstáculos da vida, a sociedade ainda acredita na sua incapacidade e os meios de
comunicação refletem essa mentalidade”. A sociedade continua sem (in)formação para
acreditar nas potencialidades dessas pessoas. A diferenciação que os meios de
comunicação fazem entre as Olimpíadas e as Paraolimpíadas é o maior exemplo de que
a mídia, como reflexo da sociedade (ou o inverso), constrói uma realidade para ser
consumida pelo público, já que mostrar a deficiência só dá “ibope” se for em situações
que explicitem o “exótico-humano”.
Olimpíadas x Paraolimpíadas
De quatro em quatro anos o maior evento esportivo do mundo, as Olimpíadas,
movimentam bilhões de dólares; em Atenas, 2004, cerca de um bilhão de dólares foram
gastos em direitos de transmissão de imagens e 16033 jornalistas cobriram o espetáculo.
Já nas Paraolimpíadas, que receberam o título de segundo maior evento esportivo
mundial, em Atenas apenas 3000 jornalistas fizeram a cobertura dos Jogos.
De acordo com a coordenadora de comunicação do Comitê Paraolímpico
Brasileiro, Gisliene Hesse, “(...) a divulgação do esporte paraolímpico ainda não pode
ser comparada com o olímpico, que se sobressai pela tradição e maior
desenvolvimento”. Então, com a finalidade de que o movimento paraolímpico tivesse
ampla divulgação e maior valorização, o CPB (Comitê Paraolímpico Brasileiro)
contratou a produtora de vídeo Íntegra Produções, coordenada por Marcos Malafaia,
para captar, editar e transmitir gratuitamente imagens dos jogos de Atenas, para as
emissoras brasileiras interessadas. Além disso, oito emissoras abertas e fechadas foram
convidadas pelo Comitê para cobrirem a competição (Rede TV, Record, TVE, TV
Nacional, Sport TV, Rede Gazeta, NSB e Rede Bandeirantes); outros dez veículos
também foram convidados, Rádio Eldorado, Rádio CBN, Folha de São Paulo, Jornal da
Tarde, Lance!, Estado de Minas, Diário de Pernambuco, Tribuna do Norte, Jornal de
Brasília, O Dia, O Globo e o portal UOL.
Segundo o presidente do CBP (Comitê Paraolímpico Brasileiro), Vital Severino
Neto, “o CPB passou a trabalhar com a perspectiva de uma cobertura diferenciada no
momento em que entrou em contato com Marcos Malafaia”.
Os Jogos Olímpicos começaram em 776 a.C. em Olímpia, na Grécia antiga, e
duraram por mais de mil anos. Entretanto, o evento religioso que deu origem aos Jogos
é bem mais antigo, podendo datar do século 13 a.C. Durante todos esses anos os Jogos
Olímpicos se desenvolveram; a primeira edição dos Jogos da Era Moderna aconteceu
em Atenas, em 1896, e reuniu 14 países e 311 atletas, já na sua edição mais recente,
realizada, também, em Atenas em 2004, 201 países e mais de 10651 atletas
participaram. Se por um lado, esse crescimento representa a vitória do ideal olímpico
moderno, por outro gera, no mundo dos esportes, uma série de problemas que os
estudiosos atribuem ao próprio gigantismo dos jogos. Em primeiro lugar, torna-se cada
vez mais difícil organizá-los, pelo altíssimo investimento financeiro que representam
(os alemães ocidentais gastaram cerca de 630 milhões de dólares com os de Munique).
E também pela importância que a vitória nos campos do esporte passou a ter em termos
de prestígio político.
Os Jogos Paraolímpicos tiveram sua primeira versão em 1960, em Roma, e
contava com a participação de 23 países e 400 atletas; em sua edição mais recente, em
Atenas 2004, o evento reuniu 143 países e 4000 atletas; os investimentos atingiram
patamares antes inimagináveis; patrocinadores mundiais ajudaram a custear a
competição e a profissionalização do esporte foi visível. Os números mostram que entre
a primeira e a última versão dos Jogos houve uma grande evolução, o esporte para
pessoas com deficiência abandonou o caráter estritamente de lazer e de reabilitação,
passando a buscar também o alto-rendimento. Assim, aumentou-se o interesse da mídia
por esse segmento esportivo; contudo, segundo o jornalista do Correio Braziliense, José
Cruz, “Ainda não há uma cobertura sistemática do esporte paraolímpico (...)”15. A
Paraolimpíada de Atenas foi um marco para o paradesporto brasileiro, porque, de
acordo com o presidente do CPB (Comitê Paraolímpico Brasileiro) o para-atleta voltou
de Atenas como um ídolo, e reconhecido pelo público; o Brasil que voltou da Grécia
despertou a consciência nacional para o esporte paraolímpico, atraindo, assim, as
atenções da mídia e das grandes marcas empresariais.
Tabela comparativa
Olimpíadas
Paraolimpíadas
Fonte: Comitê Paraolímpico Brasileiro, disponível em <
www.cpb.org.br>
* Em Tóquio, 1964, teve o início do processo de consolidação da divulgação do esporte
paraolímpico pelos meios de comunicação, porém os números ainda não foram
corretamente avaliados.
Por problemas de organização, as Paraolimpíadas de 1968 e 1972 (Tel-Aviv e
Heidelberg) ocorreram em cidades diferentes da sede das Olimpíadas, constituindo
exceções na história dos Jogos Paraolímpicos. Em 1988, em Seul, os jogos voltaram a
ser disputados na mesma cidade que abriga as Olimpíadas.
Conclusão
Enquanto o Comitê Paraolímpico Brasileiro se esforça para ampliar a divulgação
do paradesporto, o Comitê Olímpico Brasileiro falha nesse sentido, deixando de
credenciar veículos on-line (internet); o presidente do COB (Comitê Olímpico
Brasileiro) diz que a entidade optou por não credenciar sites e portais com o intuito de
"atender aos veículos de grande imprensa que tradicionalmente vêm cobrindo os Jogos
Olímpicos".
Os Jogos Olímpicos são tanto um evento esportivo quanto midiático. A primeira
transmissão de TV realizada no mundo foi experimental, durante os Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936; “o registro visual daqueles jogos definiu a estética olímpica das
décadas seguintes, marcada pela celebração do corpo atlético e a exploração das
coreografias de massa”. Já Sydney deve passar para a história como marco do declínio
da cobertura televisual e ascensão da cobertura pelas novas mídias (internet).
Apesar da cobertura das Paraolimpíadas ser ainda muito pequena com relação às
Olimpíadas, notamos que está havendo uma mudança significativa na divulgação dos
Jogos Paraolímpicos. Um estudo realizado, pelo Comitê Paraolímpico Internacional,
com 17 países, aponta uma audiência televisiva acima de 1,8 bilhões de pessoas durante
os Jogos Paraolímpicos de Atenas 2004. O Japão teve o maior índice de audiência
acumulada (587 milhões), seguido pela França (335 milhões), Alemanha (310 milhões)
e China (309 milhões). Em relação à audiência acumulada, a maior fatia de mercado,
contudo, foi alcançada pela Nova Zelândia (26,4%), Suíça (21,6%) e Áustria (21,1%).
Dos países analisados, o Brasil transmitiu o maior número de horas (168 h), seguido
pela Espanha (125 h).
A diretora de Mídia e Comunicação do Comitê Paraolímpico Internacional,
Miriam Wilkens afirma que, “Este desenvolvimento confirma que tem havido um
significativo aumento no interesse pelos Jogos Paraolímpicos”.
Assim percebemos a importância de responder a todas as questões colocadas no
início da pesquisa, porque a mídia não faz a mesma cobertura das Olimpíadas e das
Paraolimpíadas? Como a mídia auxilia o desenvolvimento de ambos espetáculos
esportivos? Como a sociedade se comporta diante dos Jogos Olímpicos e dos
Paraolímpicos? E porquê? Analisar essas questões foi o objetivo do presente estudo
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.