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quinta-feira, 18 de abril de 2024

A relevância da vida social das formigas na estruturação dos ecossistemas terrestres



Ciência e literatura como proposta transdisciplinar de conscientização ecológica

A proposta do presente artigo é apresentar alguns pontos relevantes da história natural das formigas e as possíveis associações que podem ser feitas em um contexto transdisciplinar de conscientização ecológica. A partir deste grupo de insetos, é possível fazer generalizações e posteriormente estender conclusões ecológicas para outros grupos taxonômicos, estabelecendo conceitos fundamentais sobre os serviços ecossistêmicos desempenhados pelas variadas formas de vida que nos cerca – e que na maioria das vezes está oculta aos olhos humanos. Mesmo com o excepcional volume de informação disponível nos dias de hoje, principalmente por causa da revolução de meios de comunicação, a falta de integrações que esclarecem conceitos e universalidades do conhecimento ainda é um desafio contemporâneo. Ao me basear em conceitos ecológicos para apresentar a vida social das formigas, invoco passagens da literatura brasileira como proposta de uma abordagem integrativa que se manifeste em uma reflexão ecológica sobre nosso papel no gerenciamento e conservação da biodiversidade brasileira. 

Introdução 

Há algum tempo circularam pelas redes sociais alguns vídeos que mostravam a arquitetura de uma enorme colônia de formigas, revelando uma espantosa estrutura composta de túneis no subsolo de uma floresta2 que deixaria Oscar Niemeyer embasbacado. De imediato, lembrei-me de um provérbio sobre esses insetos que muitas pessoas pensam ser insignificantes. Salomão, o famoso rei de Israel, parece ter adquirido alguns ensinamentos pertinentes para governar seu povo depois de observar esses minúsculos artrópodes quando aconselha: ―vai ter com a formiga, ó preguiçoso, e considera o seu proceder, e aprende dela a sabedoria. Não tendo ela guia, nem mestre, nem príncipe, faz o seu provimento no estio, e ajunta no tempo da ceifa com que se sustentar‖ (Livro dos Provérbios, 6: 6-8). 

Quando norteamos abordagens ou discussões de acordo com os preceitos da Ecologia (ou de qualquer ramo científico derivado dela, como a Biologia da Conservação), temos de levar em conta toda a gama de interações que ocorre entre os seres vivos. Embora isso não seja uma tarefa nada fácil, as formigas são um bom exemplo para descortinar a complexidade de interações ecológicas que ocorrem na natureza; ainda, esse grupo taxonômico representa bem a importância e magnitude dos serviços ecológicos prestados que são invisíveis ou negligenciados no cotidiano da maioria das pessoas. A estrutura de formigueiros mostrados em vídeos populares na web, apesar de serem impressionantes, é apenas uma pequena amostra do poder secreto destes insetos. Há muitos espaços interessantes que abordam sua vida social, desde entrevistas com especialistas3 , até documentários completos4 conduzidos por entomólogos (i.e., cientistas que estudam insetos) de referência mundial no estudo desses incríveis animais, mas por ora, limito-me a invocar uma passagem que nos dá informações muito relevantes sobre o papel ecológico das formigas, ao mesmo tempo que enfatiza o nosso viés antropocêntrico de pensar o mundo. O trecho a seguir é do livro autobiográfico Naturalista (1997, pg. 279) do renomado biólogo Edward O. Wilson, professor e pesquisador da Universidade de Harvard, EUA:

Manchinhas avermelhadas e escuras que ziguezagueiam pelo chão para se enfiarem buracos, elas estão em toda parte; com o peso expresso em miligramas, são habitantes de uma estranha civilização que oculta de nossos olhos sua rotina diária. Por mais de cinquenta milhões de anos e onde quer que haja terra, com exceção das camadas de gelo das regiões polares e alpinas, as formigas têm sido insetos esmagadoramente dominantes. Pelos meus cálculos, há de um a dez quatrilhões de formigas vivas, todas pesando juntas, pela ordem mais próxima de magnitude, tanto quanto a totalidade dos seres humanos. Mas uma diferença, uma diferença vital se oculta nessa equivalência. Enquanto as formigas existem na quantidade mais correta possível em relação ao restante do mundo vivo, os humanos se tornaram numerosos demais. Se estivéssemos fadados a desaparecer hoje, o ambiente terrestre retornaria ao fértil equilíbrio que prevalecia antes da explosão populacional humana. Apenas cerca de uma dezena de espécies (entre as quais os piolhos, cães e gatos domésticos e um ácaro que vive nas glândulas sebáceas de nossa testa) dependem de nós. Mas, se as formigas desaparecessem, dezenas de milhares de outras espécies de plantas e animais pereceriam também, simplificando e enfraquecendo por quase toda parte os ecossistemas terrestres."

Este épico e retumbante sucesso na colonização e estabelecimento em solos ao redor do mundo se deve a uma exímia organização social - que chega a espantar pela simplicidade - que se resume a colaboração e divisão de funções. E quando tomamos consciência deste fato, é difícil evitar a sensação de que o planeta, em boa parte, pertence às formigas, por mais desagradável que isso soe aos ouvidos humanos; é chocante perceber que as formigas não são pragas. A essência da transcrição acima é essa verdade ecológica: se as formigas desaparecessem, centenas de milhares de espécies seriam extintas e muitos ecossistemas ficariam perigosamente desestabilizados. Essa importância na estruturação dos ecossistemas terrestres do planeta se dá por regras elementares envolvidas na manutenção da vida, que essencialmente respeitam princípios básicos da termodinâmica: 

(1) o da conservação de energia, que prova que um sistema não pode criar ou consumir energia, mas apenas armazenála ou transferi-la, e 

(2) o da entropia, que é a tendência da energia se dissipar.

As formigas têm um papel fundamental no dinamismo dos ciclos biogeoquímicos que são responsáveis pelos fluxos de energia e matéria na natureza, uma vez que elas participam de muitas etapas ecológicas desses processos. Ao lado dos cupins e minhocas, as formigas arejam, revolvem e drenam diariamente toneladas de terra e assim garantem a boa saúde do solo, mais tarde enriquecido pela matéria orgânica que os insetos levam para os ninhos. ―Hoje se sabe que as formigas são mais importantes que as minhocas nesse trabalho‖, diz o mirmecólogo (i.e., especialista em formigas), Carlos Alberto Brandão, da Universidade de São Paulo. Edward Wilson, por sua vez, calcula que elas desfazem e enterram nove de cada dez pequenos animais mortos em qualquer ponto do planeta (DIEGUEZ & PAPAROUNIS, 1993).

A Ecologia é um ramo científico muito recente na história da ciência, o que a faz emprestar conceitos de várias áreas do conhecimento, sendo portanto uma disciplina transdisciplinar por excelência. O mais interessante na filosofia científica é justamente o fato de assumir que cientista algum poderá jamais fazer uma descoberta sem se basear sobre os elementos deixados por seus antecessores. E tão espantosa quando interessante, é a constatação que certas ideias são compartilhadas em várias linhas de pesquisa. É atribuído a Antoine Laurent de Lavoisier (1743 —1794), o químico francês considerado o pai da química moderna, um aforismo bem conhecido que encerra em si a ideia mais elementar da termodinâmica e da própria ecologia: ―Na natureza nada se perde, nada se cria, tudo se transforma.

Os ecossistemas terrestres não fogem à essa regra, afinal eles funcionam como qualquer sistema termodinâmico estudado por físicos ou químicos que investigam o comportamento de partículas, átomos ou moléculas. Na ecologia, entretanto, a unidade mais básica e fundamental para o entendimento de um ecossistema é a espécie, daí a importância de se conhecer bem a história natural de nossa flora e fauna para entendermos a dinâmica e funcionamento de comunidades e ecossistemas. Somente assim poderemos nos beneficiar de  seus serviços, inclusive para nosso bem-estar e qualidade de vida, sem a agressão desenfreada e inconsequente da atualidade, e para isso é essencial que continuemos a aprender e encontrar soluções observando o mundo vivo ao nosso redor – mas nos inserindo no ambiente como mais um ramo na árvore da vida, e não com o pensamento antropocêntrico de estamos no topo de alguma escala evolutiva.

A natureza é grande nas coisas grandes, e grandíssimas nas pequeninas: o valor das pequenas coisas na Ecologia e na Evolução

O sucesso evolutivo das formigas tem muito a ver com a vida em grupo, uma preciosa combinação envolvendo organização, especialização e cooperação, tudo isso sustentado por um sistema de comunicação, sobretudo química, desenvolvimento durante sua longa história evolutiva (WILSON, 2013). A seleção de hábitat, por exemplo, é feita por uma espécie de consenso. Cada formiga libera marcadores químicos em partes da trilha, informando assim que tem preferência por aquele trecho. Comunicação, colaboração: quanto mais forte o sinal químico, mais a trilha é usada. Portanto, elas não têm líder, e sim um consenso da comunidade, que é estabelecido pela intensidade do ‗aroma químico‘. Outro exemplo de cooperação é o que os cientistas chamam de ‗estômago social‘: em algumas espécies, castas especializadas regurgitam o alimento coletado fora do formigueiro para os indivíduos que ficaram trabalhando na manutenção interna da colônia. Cada vez mais, as pesquisas com esses insetos mostram a grandiosidade da ação em conjunto, que equivale a um superorganismo. Para se ter uma ideia da magnitude do impacto ecológico desses insetos, basta dizer que o consumo de biomassa pelas formigas dos pampas argentinos afeta o consumo de capins por parte do gado criado na região.

Se a sociedade humana ainda tem muito o que aprender com as das formigas, somos dignos de dó quando nos compararmos individualmente com esses guerreiros em miniatura. Além de já nascerem com uma estrutura corporal (exoesqueleto) que mais parece uma armadura de samurai, experimentos mostram que a taxa metabólica das formigas é bem superior à nossa – e.g., ao cortar uma folha com suas mandíbulas, a taxa metabólica de uma formiga é três vezes maior do que a de um atleta no máximo de sua performance. Sem contar a carga transportada em proporção ao peso corporal ou às distâncias percorridas. Nesse sentido, uma saúva carregando apressadamente um pedaço de folha equivaleria a um ser  humano carregando um fardo bem pesado, por dezenas de quilômetros, sem parar, a uma velocidade que nunca atingiríamos a pé.

Oliveira (1990) faz um levantamento de curiosidades interessantes relacionadas a refinada organização social das formigas, e como elas não cessam de maravilhas os pesquisadores. Para o nosso contexto, vale ressaltar que se todos os animais terrestres fossem colocados numa balança, 1/10 do peso (cerca de 900.000 toneladas) seria representado por formigas, esse inseto com menos de um milionésimo da massa de um ser humano. Isso significa que a população de formigas é maior que a de todas as aves, répteis e anfíbios juntos, sendo estimada em torno de 10 quintilhões de indivíduos (o número 1 seguido de dezenove zeros). "Mas não é pelo peso ou pelo número que as formigas devem ser distinguidas", lembra o entomolólogo americano E. O. Wilson, da Universidade Harvard. "O desaparecimento desses insetos poderia levar à extinção milhares de espécies, desestabilizando a maioria dos ecossistemas." Wilson e seu colega Bert Hölldobler publicaram em 1994, nos Estados Unidos, o livro Ants (Formigas), logo aclamado como um clássico, onde analisam o comportamento de seus animais preferidos e aponta várias peculiaridades de sua organização social.

Outro papel ecológico desempenhado pelas formigas que é de suma importância é a disseminação de sementes de plantas e a função de ‗faxineiras‘, já que comem até 90% dos cadáveres de pequenos animais. Todos esses trabalhos são levados muito a sério. Para começar, nada de sexo - atividade exclusiva das rainhas. As trabalhadoras devem se limitar a fazer a parte que lhes toca para conservar o lar comunitário e garantir a propagação dos genes de sua parenta privilegiada. Assim, para realizar suas funções com plena eficiência, cada uma se especializa ao máximo, mudando a própria anatomia. Os soldados são fêmeas que trocaram os órgãos reprodutores por um abdômen cheio de armas biológicas. O gênero asiático Camponotus, por exemplo, é uma verdadeira bomba, que rompe o próprio corpo para lançar veneno sobre os adversários. As lava-pés, como são conhecidas as Solenopsis invicta nativas do sul do Brasil, tem um veneno forte que causa sensação de queimadura. Elas associam-se em colônias protegidas por um contingente de até 100.000 soldados. Longe de casa, são capazes de unir-se rapidamente para o combate por meio de ordens químicas. As formigas, por sinal, dominam uma linguagem química complexa. Uma colônia comum pode farejar no ar 1 trilionésimo de grama de uma dúzia de sinais de cheiros diferentes, de acordo com os feromônios secretados no solo por várias glândulas. É desse modo que uma operária indica a outra companheira o caminho até um inseto morto. Mas o talento das formigas como químicas tem seu melhor exemplo na Oecophylla, a formiga-tecelã que vive em árvores. Presentes em abundância nas florestas da África e no sudoeste da Ásia, elas se utilizam da seda produzida pelas larvas para ligar folhas e galhos, formando grandes e seguros pavilhões aéreos, que funcionam como as teias das aranhas (OLIVEIRA, 1990).

Atualmente é bem sabido pela ciência que o CO2 é o principal gás emitido por meio de atividades humanas, de acordo com a Revisão de Gases Estufa da Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos. E o volume liberado só aumentou desde a revolução industrial, contribuindo para o aquecimento global. O que foi novidade para a comunidade científica muito recentemente é que as formigas também podem ajudar a capturar CO2 e auxiliar na luta contra o aquecimento global. Schults (2014) explica os detalhes mais relevantes de estudo publicado recentemente no periódico Geology, onde os pesquisadores associaram as formigas à aceleração do armazenamento de dióxido de carbono natural em rochas. Respondendo ao estudo, David Schwartzman, professor emérito de biogeoquímica da Howard University que revisou a pesquisa, declarou que as formigas podem ter um papel importante parar o sequestro de carbono da atmosfera, embora as pesquisas nessa área ainda estão apenas em seus primeiros passos.

 Por outro lado, o papel das formigas na cadeia alimentar já é bem conhecido pelos ecólogos. Muitas aves, lagartos, sapos, alguns besouros e também o homem incluem esses insetos em suas dietas. "Os índios tupis já preparavam há centenas de anos as ycobas (içás), palavra que significa gordura, devido ao abdômen cheio de ovos", informa o zoólogo Nélson Papavero, no livro Insetos no folclore. "Eram torradas como amendoim, moqueadas e servidas com molho de tucupi bem apimentado ou então assadas em paçoca com farinha de mandioca", descreve Papavero. Alguns grupos indígenas usam também as gigantes saúvassoldados como grampos para ligar as bordas de cortes na pele. A aplicação é simples: colocam as formigas para morder a ferida e arrancam seus corpos, ficando a cabeça presa ao ferimento para auxiliar a cicatrização (OLIVEIRA, 1990).

A organização e eficiência da vida em sociedade: as saúvas como personagens da história do Brasil

Qualquer pessoa que tenha observado as paisagens em torno das estradas ou reparado em algum pasto em sua cidade já avistou grandes formigueiros ou cupinzeiros, uma vez que ao edificar suas moradas estes insetos acumulam montes de terra na superfície, chegando a  alturas consideráveis. Oliveira (1990) ressalta que essas construções de terra são endurecidas como um verdadeiro telhado de barro, que acabam abrigando alguns atraindo outros, como tatus e tamanduás, cujo prato predileto (e invariável o ano inteiro) são precisamente formigas saúvas. Outros bichos preferem esperar a época da primavera, quando as formigas aladas encarregadas da reprodução (no caso das saúvas, elas conhecidas como içás ou tanajuras, no caso das fêmeas, e bitus, os machos) começam a revoada de acasalamento. O autor também discute os benefícios e prejuízos que as formigas podem causam aos seres humanos, pois com a mesma eficiência que elas revolvem a terra e contribuem para a fertilidade do solo, elas também pode destruir lavouras inteiras ou mesmo competir com o gado por gramíneas.

Essa voracidade das saúvas fez com que elas adquirissem má fama, pois são uma das forças mais dominantes do planeta, e em alguns casos, tão inteligentes quanto suas primas, as abelhas. Dieguez. & Paparounis (1993) destacam que os entomólogos defendem que as formigas possuem uma espécie de inteligência que não funciona no cérebro, mas sim embutida nas habilidades desenvolvidas em conjunto por esses pequenos seres. Acima de tudo, sua sagacidade transparece por meio da vida em sociedade: entre milhões de espécies classificadas na categoria dos insetos, apenas as formigas e os cupins desenvolveram ao máximo esse método de dividir tarefas e multiplicar a eficiência do trabalho. Em suas comunidades, todas as fêmeas operárias são estéreis e os machos servem apenas para inseminar a rainha, única fêmea fértil. Chamam-se ―eussociais‖ os seres que praticam tal forma de matriarcado, que foi decisiva: somente 5% de todas as espécies de abelhas, por exemplo, têm comportamento social, mas estas últimas superam largamente em número os 95% restantes.

Não é à toa, portanto, que costuma-se dizer que colmeias e formigueiros não são simples ninhos, e sim uma espécie de ‗superorganismo‘. As bem conhecidas colmeias abrigam em média 50.000 moradores, mas os sauveiros são ainda mais complicados, e podem reunir mais de 5 milhões de habitantes. Em cada um deles, túneis estreitos interligam dezenas de câmaras — os locais onde as saúvas efetivamente vivem. São ocos subterrâneos, geralmente com meio metro de altura, usados para diversas funções: desde lixeiras comunitárias (também usadas como cemitérios), até berçários onde a rainha deposita ovos. No final, a construção equivale a um prédio de três andares enterrado a 10 metros de profundidade. Aí, o maior compartimento é o de cultivo, onde folhas que chegam do exterior são dispostas com cuidado e adubadas com o hormônio fertilizante, excretado pela rainha, o ácido indolil-acético. Uma casta inteira de saúvas, as chamadas jardineiras, com cerca de 2 milímetros de comprimento, nunca sai do formigueiro. Elas existem para cuidar do fungo, o que inclui cortar ‗ervas daninhas‘, ou seja, os fungos que não servem para comer. As cortadeiras, que trazem as folhas, têm 5 milímetros e labutam no mundo externo sob a proteção dos taludos soldados, com 1,5 centímetro. Estima-se que um sauveiro maduro chega a cortar cerca de 8 toneladas de folhas por ano — o suficiente para alimentar três bois. (DIEGUEZ. & PAPAROUNIS, 1993).

Sem dúvida, foi justamente essa eficiência que sustentou o visceral preconceito contra a saúva, sendo possível identifica-las até em passagem literárias, o que reflete que as saúvas estão relacionadas com a própria história do Brasil. Já em 1560, o padre José de Anchieta afirmava desdenhosamente que, entre as formigas do país, só mereciam menção ―as chamadas içás, que estragam as árvores‖. O personagem Macunaíma, da obra homônima, de 1928, do escritor modernista brasileiro Mário de Andrade, também faz menção a essas formigas em particular quando atesta que ―pouca saúde e muita saúva, os males do Brasil são". Esse verso parece inspirado num vaticínio famoso, escrito 100 anos antes pelo naturalista francês Auguste Saint-Hilaire: ―Ou o Brasil acaba com a saúva ou a saúva acaba com o Brasil‖. No entanto, o erro básico desse modo de ver as formigas como inimigas é tirar da trama o principal vilão da história: o próprio homem. Hoje sabemos, por exemplo, que uma das causas da proliferação de saúvas que acabou por provocar prejuízos catastróficos na economia brasileira no século passado se deve as drásticas reduções populacionais de tamanduás e outros vertebrados que incluem as saúvas em sua dieta, uma vez que sofreram com a fragmentação de hábitat provocado pelo avanço agrícola da época para cultivo das plantações de café, uma das principais engrenagens econômicas do país naquela época.

É fácil perceber, à luz da ecologia, que a saúva causa grandes estragos onde o homem gerou fortes desequilíbrios ecológicos. Os pastos são um exemplo histórico: em alguns deles se podem contar até mais de 50 sauveiros em cada quadrado de apenas 100 metros de lado. Um caso notório dessa prática ocorreu em Mato Grosso do Sul, que se diz ostentar a maior concentração de formigueiros do mundo: reunidos num só, eles cobririam 500 quilômetros quadrados, área quase igual à da cidade de Porto Alegre. O desastre foi detectado no centro do Estado, onde a mata de 2.500 quilômetros quadrados havia sido derrubada para dar lugar monocultura de eucaliptos. A conclusão inevitável dos biólogos é que a ‗praga‘ saúva segue os desajeitados passos humanos na natureza. E não só a saúva: a doméstica lava-pés, por exemplo, tem sido acusada de devorar até crianças no Estado americano do Texas, para onde foi levada provavelmente em cargas de navios (OLIVEIRA, 1990; DIEGUEZ & PAPAROUNIS, 1993).

No caso das saúvas brasileiras, apesar de preferirem fazer o corte de folhas à noite para evitar os predadores, é possível vê-las trabalhando durante o dia caso pressintam, por mecanismos ainda desconhecidos, a chegada de chuvas no entardecer. Oliveira (1990) destaca que durante as tempestades, estas incansáveis formigas finalmente param de trabalhar para se proteger no interior dos ninhos que, embora feitos de terra, não ficam completamente inundados. As câmaras internas, ou panelas, como se denominam os grandes salões no interior do sauveiro, são dispostas lateralmente aos túneis de forma a evitar que sejam destruídos pelas grandes chuvas. Como nos diversos ambientes de uma residência humana, em cada câmara pratica-se um tipo de atividade diferente. No que se poderia chamar de cozinha, ou horta comunitária, cultiva-se um fungo para a alimentação de toda a colônia; nos quartos funcionam um tipo de berçário para os ovos das saúvas, também criados em meio ao fungo, e em outras dependências funcionam o ‗lixão‘ e o cemitério, onde são depositadas as formigas mortas da colônia. O fungo que serve de alimento às formigas, o Pholota gongylophora, por sinal, só pode ser encontrado em câmaras específicas. Ali, operárias jardineiras, medindo de 2 a 3 milímetros, picam em partes cada vez menores os pedaços de folhas que chegam, as quais são implantadas nas esponjas de fungos, que as utilizam como alimento. Além disso, as jardineiras retiram constantemente pedaços mortos do fungo, assim como folhas secas, e mantêm as condições climáticas ideais para o desenvolvimento do fungo, já que longe desses cuidados, o Pholiota raramente sobrevive. Mas todo esse esforço despendido pelas formigas é compensado, uma vez que tal fungo lhes fornece a capacidade de digerir a celulose e outras substâncias tóxicas dos vegetais.

Numa coisa, portanto, o herói de Mário de Andrade estava certo: as diversas espécies do gênero Atta são o maior grupo de formigas do Brasil. O padre Anchieta e Saint-Hilaire também anunciam bem o poder de um dos exércitos mais poderosos do mundo que, embora compostos por minúsculos invertebrados, são capazes de arquitetar câmaras, galerias e túneis faraônicos e muito bem organizados para o funcionamento pleno do formigueiro. Mais uma vez, devido a constante combinação que esses insetos sociais desenvolvem com maestria: organização, especialização e cooperação.

Fluxo de energia e o conceito de capacidade de suporte: o que é ser ‘ecologicamente correto’? Uma lição a ser aprendida pelos humanos 

Em última instância, toda e qualquer espécie tem o crescimento de suas populações limitado pela disponibilidade de recursos no seu ambiente. Foi dessa fonte que bebeu o próprio Charles Darwin (1809-1882) durante a gestação de sua teoria evolutiva, pois foi após ler o livro ―Ensaio sobre princípios populacionais‖, do economista Thomas Malthus (1766- 1834), é que o jovem naturalista inglês foi capaz de conceber o raciocínio de seleção natural – o mecanismo que favorece os organismos mais bem adaptados para competir por recursos do ambiente. Se somos mais uma espécie animal, nós não temos como fugir dessa regra; pesquisas comportamentais com colônias de formigas podem oferecer informações preciosas sobre o fluxo de energia e capacidade de suporte, algumas das quais podem ser aplicadas ao Homo sapiens. 

Em um estudo hoje considerado clássico, Lugo e colaboradores (1973) investigaram as saúvas (Atta colombica) que vivem nas florestas tropicais úmidas da Costa Rica, onde coletam fragmentos de folhas novas na vegetação, levando-os aos formigueiros subterrâneos a fim de servirem de substrato para culturas de fungos, dos quais elas se alimentam. Os pesquisadores estimaram os gastos de energia das diferentes atividades dentro de uma colônia e concluíram que a capacidade de suporte (i.e., o tamanho máximo da colônia) é atingida quando a entrada de calorias, na forma de folhas coletadas, equilibra o custo energético do trabalho envolvido no corte e transporte das folhas, na manutenção das trilhas e no cultivo dos fungos. Os pesquisadores observaram ainda que, em um dado momento, nas colônias grandes, 25% das formigas estavam carregando folhas, enquanto 75% estavam cuidando das trilhas e dos jardins de fungos. Quando a entrada de energia era equilibrada pelos custos de manutenção, a colônia parava de crescer. 

Graças a estudos como esses, sabemos hoje que as colônias de formigas dependem de subsídios enormes importados de fora, tirados, muitas vezes, de fontes que se acumularam muito antes do aparecimento do ser humano. É consenso entre os pesquisadores que as populações humanas parecem se aproximar dos níveis máximos da capacidade de suporte dos seus respectivos ambientes. Apesar de atualmente a taxa de crescimento da população humana ser declinante, parar de crescer não impedirá que o consumo global deixe de aumentar. A chave do problema é baixar a taxa de consumo per capita, já que os recursos limitantes que mais causam preocupação atualmente são alimento, hábitat e combustíveis fósseis (ODUM & BARRET, 2007). 

A explosão demográfica humana das últimas décadas foi promovida pelo aumento da quantidade de alimento disponível e, mais recentemente, pelas melhorias no saneamento básico. O primeiro fator elevou a taxa de natalidade, enquanto o segundo reduziu a de mortalidade. Um exemplo familiar é o hino da copa do mundo de futebol de 1970, que dizia ―noventa milhões em ação, pra frente Brasil do meu coração…‖. E fomos! Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o Brasil comportava mais de 190 milhões de habitantes em 2010. Em 40 anos, portanto, mais do que dobramos a nossa população. Uma consequência lógica disso foi o aumento na demanda por bens e serviços, o que implicou em derrubarmos (mais) florestas, construirmos (mais) barragens – o que resultou em alagarmos (mais) terrenos – e, por fim, produzirmos (mais) lixo e contaminantes. No fim das contas, a demanda por mais espaço tende a fazer com que outras espécies percam seus hábitats, seja para a construção de casas, ruas, rodovias, pastos ou plantações. 

Como levantado anteriormente, não fomos os inventores da agricultura e da pecuária, e sim as formigas. Apenas dois gêneros de todo o reino animal foram espertos o bastante para fugir às incertezas da vida e garantir a sobrevivência por meio daquilo que semeiam e colhem. O homem é definitivamente um novato: existe há pouco mais de 2 milhões de anos, aprendeu a arte do cultivo há coisa de 100 séculos e hoje é representado por uma única espécie sobre a face do planeta, o Homo sapiens. Embora o processo de domesticação foi, sem dúvida, um dos eventos mais importantes da história humana, ela é muito recente em nossa história evolutiva. A nossa agricultura, segundo os arqueólogos, parece ter surgido e se espalhado em diferentes regiões do mundo, em algum momento entre 10.000 e 5.000 anos atrás. A transição de uma vida como coletores-caçadores para uma vida como cultivadores de alimento fez com que a nossa civilização se tornasse sedentária e prosperasse, o que na literatura técnica passou a ser chamado de ‗a revolução do Neolítico‘ (WEISDORF, 2005). Por outro lado, as formigas veem fazendo esses cultivos de outros seres vivos há milhões de anos. 

Os pulgões, que são parentes próximos das cigarras e dos percevejos, têm uma relação mutualística histórica com as formigas que antecede qualquer hominídeo que já tenha passado pela face da Terra. Os pulgões se alimentam de seiva das plantas, um material rico em açúcares, e o que não é digerido é avidamente consumido por certas formigas. Estas, por sua vez, cuidam do ‗rebanho de pulgões‘ ao afugentar predadores (GULLAN & CRANSTON, 2013). Além da domesticação de animais, algumas formigas são ótimas agricultoras, já que cultivam fungos no interior de seus formigueiros. Cada pedaço de folha que chega a uma colônia é tratado com um defensivo natural produzido pelas próprias formigas, para evitar que microrganismos proliferem e contaminem o jardim de fungos. A eficiência desse processo é muito superior ao que acontece quando aplicamos pesticidas para combater as pragas de nossas lavouras.

Nossas formidáveis concorrentes, que existem há um tempo que se mede na casa dos 100 milhões de anos, trazem do berço as técnicas agrícolas e são representadas por dezenas de espécies sobre a Terra. São as saúvas que aprenderam a cultivar um fungo sobre um canteiro de folhas cortadas, para depois usá-lo como alimento. Por isso, muitos entomólogos, estudiosos de insetos, as consideram os mais avançados animais dessa categoria — talvez mais que as abelhas, suas primas. Não é à toa que saúvas e abelhas têm tanta importância no mundo moderno. Ambas são descendentes de um inseto sagaz que há mais de 200 milhões de anos descobriu um meio de colonizar o subsolo, que era, então, um vasto e inexplorado ambiente, apenas à espera de um aventureiro que o ocupasse (DIEGUEZ & PAPAROUNIS, 1993). Manter uma dieta bem versátil também ajuda: "elas podem explorar diferentes recursos de um ambiente sem limitação por especialização alimentar", diz o biólogo Rodrigo Feitosa, da USP. Isso significa que as formigas não são superespecialistas em sua dieta; se uma fonte de alimento acaba, elas se organizam para procurar outra sem deixar o formigueiro desprotegido (COHEN, 2013).

Em organismos eussociais, como formigas, são as características da colônia que são transmitidas às futuras gerações. Ou seja, o conceito de evolução se aplica ao coletivo, não ao indivíduo. As formigas que não se reproduzem, como as operárias, têm mais tempo para se especializar em outras tarefas, como a busca de alimento e a defesa do ninho. Cohen (2013) afirma que para os biólogos essa capacidade de evoluir em grupo é um dos fatores que garantiram a sobrevivência das formigas por mais de 100 milhões de anos, lembrando que as formigas têm relações simbióticas (com vantagens para todos) com mais de 400 espécies de plantas, milhares de artrópodes, fungos e micro-organismos.

Formigas e literatura: como pôr em prática abordagens conservacionistas e transdisciplinares? Um exemplo com Guimarães Rosa e os sistemas ecológicos do Cerrado

Mesmo com o excepcional volume de informações disponíveis nos dias atuais, principalmente por causa das facilidades trazidas pela revolução dos meios de comunicação, a falta de integrações que esclareçam conceitos e universalidades do conhecimento ainda é um desafio. É urgente e crescente a necessidade de se promover uma alfabetização ambiental científica e séria da população, mas essa abordagem de níveis múltiplos e escala ampla envolve sistemas inteiros de educação e inovação. Essa proposta de abordagem integrativa, que se preocupa em desvendar explicações de causa e efeito por meio de um entendimento transdisciplinar, tem sido chamada na literatura científica de consiliência (WILSON, 1999), de ciência da sustentabilidade (KATES et al., 2001) e de ciência integrativa (BARRET, 2001).

De fato, o desenvolvimento continuado da Ecologia parece estar cada vez mais se estabelecendo como ciência integrativa, tão necessária aos dias de hoje. No entanto, estratégias transdisciplinares ainda são muito pouco exploradas no dia-a-dia das escolas brasileiras, mesmo já sendo bem sabido que para se divulgar ciência de maneira clara e efetiva, o público deve se sentir inserido no processo histórico, reencontrando-se nos outros e identificando-se com eles. Somente esta conscientização é capaz de fazer com que o conhecimento seja uma construção social que possa fazer o estudante transitar da inércia para a autonomia, com participação ativa no meio em que vive, e não um mero produto final resultante do acúmulo de dados e informações (FREIRE, 1987; TORRES, 1997). 

O escritor Guimarães Rosa, cuja biografia mostra que ele viajou com tropeiros antes de compor suas obras, é citado aqui como exemplo por estar inserir as realidades locais do Brasil, fornecendo uma caracterização detalhada do sertanejo (seus costumes, vocabulário, crenças), e também eternizando ambientes naturais pela descrição dos cenários de suas histórias de modo bastante convincente. Em grande parte de seus livros ou contos, o escritor mineiro compõe paisagens e dinâmicas do Cerrado de uma maneira tão acurada que talvez apenas biólogos muito experientes soubessem descrever. Um professor não teria grandes dificuldades em explorar os conceitos ecológicos e os aspectos comportamentais da flora e da fauna desse bioma, implícitos nos trechos a seguir:

Do povinho mais miúdo, por enquanto, apenas o eterno cortejo das saúvas, que vão sob as folhas secas, levando bandeiras de pedacinhos de folhas verdes, e já resolveram todos os problemas do trânsito. Ligeira, escoteira, zanza também, de vez em quando, uma dessas formigas pretas caçadoras amarimbondadas, que dão ferroadas de doer três gritos. Mas aqui está outra, pior do que a preta corredora: esta formiga-onça rajada, que vem subindo pela minha polaina. Está com fome. Quer das provisões. Desço-a e ponho-lhe diante de um grumo de geleia e alguns grãos de farinha. Não quis. Fugiu. Quem vai comer do meu farnel é todo o clã das quem-quem, esses trenzinhos serelepes, que têm ali perto a boca do seu formigueiro. Uma por uma, se entrevem; largam os glóbulos de terra, trocam sinais de antenas, circulam adoidadas e voltam para a cratera vermelha. Vou espalhar no chão mais comida, pois elas são sempre simpáticas: ora um menino que brinca, ora uma velhinha a rezar. 

Como será o deus das formigas? Suponho-o terrível. Terrível como os que o louvam... E isto é também como o louva-a-deus, que, acolá, ereto, faz vergar a folha do junquilho. Ele está sempre rezando, rezando de mãos postas, com punhais cruzados. Mas, no domingo passado, este mesmo, ou um qualquer louva-a-deus outro, comeu o companheiro em oito minutos, medidos no relógio – deixou de lado apenas as rijas pernas-de-pau serrilhadas da vítima, e o seu respectivo colete....Foi-se. (...). Então fiquei meio deitado, de lado. Passou ainda uma borboleta de páginas ilustradas, oscilando no voo pulandinho e entrecortado das borboletas; mas se sumiu, logo, na orla das tarumãs. Então, eu só podia ver o chão, os tufos de grama e o sem-sol dos galhos. Mas a brisa arageava, movendo mesmo aqui em baixo as carapinhas dos capins e as mãos de sombra. E o mulungu rei derribava flores suas na relva, como se atiram fichas ao feltro numa mesa de jogo. Paz. 

- trecho do conto São Marcos, na obra Sagarana (ROSA, 2001, pg. 282)

E ele achava muitas coisas bonitas, e tudo era mesmo bonito, como são todas as coisas nos caminhos do sertão. (...) Pela primeira vez na sua vida, se extasiou com as pinturas do poente, com os três coqueiros subindo da linha da montanha para se recortarem num fundo alaranjado, onde, na descida do sol, muitas nuvens pegam fogo. E viu voar, do mulungu, vermelho, um tié-piranga, ainda mais vermelho – e o tié-piranga pousou num ramo de barbatimão sem flores, e Nhô Augusto sentiu que o barbatimão todo se alegrava, porque tinha agora um ramo que era de mulungu. 

- trecho do conto A hora e a vez de Augusto Matraga, na obra Sagarana (ROSA, 2001, pg. 401-402)

O chapadão é sozinho – a largueza. O sol. O céu de não se querer ver. O verde carteado do grameal. As duas areias. As arvorezinhas ruim-inhas. A diversos que passavam abandoados de arraras – araral – conversantes. Aviavam vir os periquitos, com o canto-clim. Ali chovia? Chove – e não encharca poça, não rola enxurrada, não produz lama: a chuva inteira se sorve em minuto terra a fundo, feito um azeitezinho entrador. O chão endurecia, cedo, esse rareamento de águas. O fevereiro feito. Chapadão, chapadão, chapadão. De dia, é um horror de quente, mas pra noitinha refresca, e de madrugada se escorropicha de frio, o senhor isto sabe. 

- trecho do romance Grande Sertão: Veredas (ROSA, 2001, p. 339-40).

Destrinchar os processos ecológicos, evolutivos e biogeográficos subjacentes nestas curtas passagens pode, concomitantemente, despertar o interesse de alunos que tenham inclinação para as Letras. O modo peculiar de escrever de Guimarães Rosa pode estimulá-los a se iniciar e/ou se aventurar, também, no mundo da literatura. É, pois, sob essa abordagem que o conhecimento científico também pode ser trabalhado: integrando-o a outros campos do saber. A ideia é justamente descortinar para os educandos a conectividade que existe entre as universalidades do conhecimento, sejam elas artísticas, culturais, históricas, sociais, religiosas ou científicas.

 O homem como gerenciador de biodiversidade: reflexões para o Brasil

O Brasil é conhecido por sua extraordinária diversidade de espécies de formigas e há muitas décadas nossos cientistas estão dedicados a estudar vários aspectos do grupo, desde sistemática, história natural, comportamento, ecologia, interações com plantas, até fatores que influenciam o número e a composição de espécies de comunidades de formigas nos diferentes ecossistemas brasileiros. Este grupo taxonômico, portanto, é um exemplo para se demonstrar toda a complexidade das interações ecológicas que ocorrem na natureza.

Em geral, as pessoas costumavam manter uma relação de grande intimidade com os locais em que viviam. Nossos antepassados eram caçadores-coletores, pequenos lavradores ou pastores, pessoas que tinham de saber com exatidão todos os detalhes físicos da região de onde tiravam o sustento, caso quisessem manter intacto seu modo de vida. A maioria de nós, que vive no mundo moderno, nada tem de comparável a isso, exceto conhecimento prático e infraestrutura de nossa própria civilização extremamente técnica. No entanto, ver e apreciar, participar o tempo todo e desde sempre de padrões que não foram estabelecidos por nós. Lopes (2007), destaca que algum dia alguém ainda irá explicar as raízes da solidão humana moderna por essa perda de intimidade com o meio ambiente, pelas nossas incontáveis transgressões em relação ao planeta físico. O autor enfatiza que já não temos mais nenhum relacionamento com a Terra, e mesmo quando ele existe, quase sempre é rápido demais, insuficiente para que as coisas sejam absorvidas. Nessa linha de raciocínio, as formigas demostram ser um bom grupo taxonômico para se ter uma ideia da complexidade e importância das relações ecológicas que ocorrem no meio ambiente que o homem compartilha com outros milhares de seres vivos.

Wilson (2008) afirma que nossa relação com a natureza é primal e discute que as emoções que ela desperta devem ter surgido durante a esquecida pré-história da humanidade e, portanto, são profundas e obscuras. A atração gravitacional da natureza sobre a psique humana pode ser expressa em um único termo, mais contemporâneo: biofilia, definido como a tendência inata para se afiliar à vida e aos processos vitais. O pesquisador ressalta que, desde a infância até a velhice, as pessoas de todas as partes do mundo sentem atração pelas outras espécies, mostrando que a apreciação da diversidade da vida é universal e intrínseca ao ser humano. Explorar a vida e filiar-se a ela, transformar criaturas vivas em metáforas carregadas de emoção, inseri-las na mitologia e na religião – eis os processos fundamentais, facilmente reconhecíveis, da evolução cultural biofílica. Essa filiação tem uma consequência moral: quanto mais compreendemos outras formas de vida, mais o nosso aprendizado se expande, abrangendo a sua vasta diversidade, e maior é o valor que atribuímos a elas – e, evidentemente, a nós mesmos. Wilson (2008, p. 78-79) discute como essa filiação influencia as nossas preferências por certos habitats:

 ―...os pesquisadores já descobriram que quando pessoas de diversas culturas, incluindo as da América do Norte, da Europa, da Ásia e da África, têm liberdade de escolher seu local de residência e trabalho, elas preferem um ambiente que combine três características. Desejam morar em um lugar alto, com vista para fora e para baixo; de onde se possa ver uma área verde, com árvores esparsas e pequenos bosques, mais semelhante a uma savana do que a um campo relvado ou a uma floresta densa; e que esteja perto de uma fonte de água, tal como um lago, um rio ou o mar. Mesmo que todos esses elementos sejam puramente estéticos e não funcionais, como acontece nas residências de veraneio, aqueles que dispõem de meios para tanto estão dispostos a pagar preços elevados para obtê-los. Em testes com várias opções, verificou-se que as pessoas preferem que sua moradia seja um retiro, com uma parede, rochedo ou alguma outra coisa sólida na parte de trás. Elas desejam ver um terreno frutífero em frente ao seu retiro. Apreciam que animais grandes, silvestres ou domésticos, estejam espalhados pelo local.

(...) Embasada em consideráveis evidências do registro fóssil, essa interpretação sustenta que os seres humanos de hoje continuam escolhendo habitats semelhantes àqueles em que a nossa espécie evoluiu, na África, durante milhões de anos de pré-história. Nossos distantes antepassados desejavam ficar ocultos em pequenos bosques com vista para uma savana ou em áreas de presas para perseguir, animais abatidos para recolher e deles alimentar-se, plantas comestíveis para coletar, inimigos para evitar. Um curso d‘água nas proximidades fazia as vezes de limite territorial e fonte de alimentos. 

Será tão estranho que pelo menos um resíduo dessa escolha de hábitat persista entre os instintos humanos? A busca programada pelo ambiente correto é um comportamento universal das espécies animais, pela melhor das razões – trata-se de um imperativo para a sobrevivência e a reprodução. 

Embora essas várias linhas de evidências sejam apenas fragmentárias, elas nos dizem que grande parte da natureza humana foi programada geneticamente durante os longos períodos em que nossa espécie viveu em contato íntimo com o resto do mundo natural vivo. Hoje as pessoas da maioria dos países não dão mais importância a essa conexão. Elas expulsaram a natureza viva para as margens da existência, e o declínio desta tem uma prioridade baixíssima na ordem das suas preocupações. Com o aumento dos conhecimentos científicos sobre a natureza humana e a natureza viva, essas duas forças criativas da auto-imagem humana irão unir-se. A ética central vai mudar, e fecharemos o círculo, passando a apreciar e valorizar todas as formas de vida – e não apenas a nossa.

Os biomas brasileiros, assim como os do resto do planeta, mudaram muito ao longo dos últimos milhões, milhares e centenas de anos. A extinção ou florescimento de linhagens, fatos naturais da dinâmica ecológica da vida, tem dependido sempre do fato das espécies estarem ou não adaptadas a viver em novos cenários – a ideia essencial da boa e velha evolução por seleção natural, proposta por Charles Darwin em meados do século XIX e que continua atual. Hoje em dia, depois do crescimento e expansão da população humana, resta pouco de todo o patrimônio biológico que tínhamos há alguns séculos, já que os fragmentos de vegetação natural perdem cada vez mais espaço para atividades antrópicas. A racionalização e aumento no volume de informações fizeram com que nos tornássemos o último tipo dominante de vida do planeta, fechando a porta à possibilidade de qualquer outro animal fizesse o mesmo avanço e viesse, quem sabe, a desafiar nossa posição privilegiada na Terra.

À medida que estendemos as explicações cientificas dentro dos domínios da biologia, nós ganhamos confiança – ou ficamos aterrorizados – pela conscientização de que nosso destino como espécie depende do nosso próprio discernimento e também do bom funcionamento de inúmeros ecossistemas, e não dos caprichos de alguma entidade sobrenatural (WILSON, 1997). À medida que pensamos com humildade sobre o nosso lugar na história da vida e à medida que refletimos sobre a nossa origem biológica, começamos a perceber que os nossos antepassados ultrapassam os limites familiares ou humanos. Compartilhamos ancestrais em comum com toda e qualquer outra forma de vida, extinta ou vivente. Afinal, biologicamente falando, somos apenas mais uma entre milhões de ramificações na árvore da vida.

Nós, brasileiros, somos detentores da fauna e da flora mais ricas de toda a América do Sul e uma das mais majestosas biodiversidades de todo o mundo. Mas como estamos agindo em relação a isso? A divulgação de informações equivocadas ou incompletas ainda encontra solo fértil em nossa sociedade, que continua a ser iludida por ideias e estereótipos que visam, na maioria das vezes, unicamente estimular o consumo. Nunca fomos tão livres social e politicamente; ao mesmo tempo, porém, nunca fomos tão submissos ao consumismo e tão passivos em relação à qualidade das informações que nos são apresentadas. Vivemos em uma sociedade que, por um lado, usufrui de avanços tecnológicos surpreendentes, mas, por outro, está mergulhada em uma futilidade angustiante (LIPOVETSKY, 2006).

Apenas uma sociedade esclarecida e consciente da riqueza biológica de seu país é capaz de identificar um discurso progressista meramente mercantilista imbuída em uma prática que polui nossos mares e rios, que devasta nossos biomas e que extirpa do território nacional variedades genéticas únicas. Estamos aprendendo que não há como pensar em desenvolver um país sem investimentos em Educação (básica e universitária) e em estratégias para conservar suas riquezas, elaborando planos racionais para sustentá-la. Devemos, portanto, tomar consciência de nosso papel no gerenciamento da biodiversidade e de reflexões e ações que garantam que o futuro ainda espelhe essa grandeza de formas de vida. Que entre outras mil, que ainda seja o Brasil a nosso pátria amada e idolatrada. Mas que seja, sobretudo, diversificada e conservada.


quarta-feira, 17 de abril de 2024

Dilemas da Sustentabilidade frente ao consumismo

UMA REFLEXÃO MUITO IMPORTANTE: 

O desenvolvimento sustentável é incompatível com o sistema capitalista? 

-> Pensamento entre os ecossocialistas e muitos não-ecossocialistas, consideram impossível que o capitalismo possa se desenvolver de forma sustentável. 

A idéia deles é que, para ocorrer o desenvolvimento sustentável, é necessário enfrentar a questão do fim do sistema. 

O desenvolvimento sustentável é uma utopia?

-> Nos mais de 230 anos do capitalismo, existem diversas maneiras de se entender o capitalismo - os que acreditam que o capitalismo tem de terminar não explicam direito como seria o fim do sistema.

No advento do capitalismo, houve, principalmente, a mudança da classe dominante: uma classe aristocrática feudal que foi substituída pela burguesia - E Marx achou que o capitalismo seria derrotado porque uma classe radicalmente oposta à burguesia, o proletariado, a derrubaria.

Essa seria a revolução seguinte?

Porém,, o proletariado não tem mostrado condições de levar adiante esse projeto - é necessário que os estudiosos mostrem qual seria a classe que viria a substituir a burguesia, o que permitiria uma avaliação das possibilidades.

É preciso que eles expliquem melhor o que eles entendem por capitalismo.

O homem controlador do universo - Diego Rivera 
Cidade do México

Voltemos ao assunto proposto no título: 

Dilemas da Sustentabilidade frente ao consumismo

Os fatos e acontecimentos do passado ajudam a compreender a formação da sociedade atual. O planeta pede socorro por não suportar mais o frenético modo de vida humano. O desenvolvimento sustentável surge como um novo modelo a ser seguido. A partir desse ponto os dilemas em busca da construção de uma nova cultura de vida emergem. Qual será o rumo desse confronto? 

Introdução 

O planeta pede socorro. A moderna civilização está destruindo, a uma velocidade espantosa, o mundo do qual depende a própria existência. Esgota e desperdiça os recursos naturais sem nenhum critério. As matas são devastadas, as terras agrícolas sofrem os danos da erosão. A poluição se generalizou de tal forma que tudo foi atingido, a água, o ar, a nossa comida. Hoje, boa parte das criaturas do planeta carregam em sua carne resíduos de produtos químicos industriais ou agrícolas, que causam mutações malignas. As atividades humanas provocam a extinção de milhares de espécies vivas. O campo magnético da Terra está alterado, a camada de ozônio, responsável pela proteção contra a radiação, tem buracos enormes e o clima sofre tantas alterações que, em um prazo de menos de 50 anos, as condições climáticas serão desconhecidas pela humanidade. 

Se o ritmo continuar o mesmo, a existência de vida nesse planeta, se tornará cada vez menos viável porque a Terra será incapaz de fornecer os princípios básicos para formas de vida complexas.  

Infelizmente não há exageros quando Edouard Goldsmith (1993, p7) faz esse diagnóstico tão pessimista. Para o autor, o motivo de tamanha destruição se deve ao simples fato de a sociedade humana se consagrar ao desenvolvimento econômico. Falando na linguagem dos números, hoje utilizamos 40% da produção primária líquida (PPL) da biosfera terrestre em nossas atividades humanas. Se o crescimento econômico continuar nesse mesmo embalo, toda a PPL terá sido consumida em poucas décadas. 

Trata-se de uma pesquisa entre materiais publicitários e acervo bibliográfico com finalidade de buscar a compreensão de certos hábitos e culturas humanas que possam justificar a situação atual do mundo, ou pelo menos alcançar entendimento um pouco mais profundo. A partir daí, explorar e estudar os dilemas entre sustentabilidade e consumismo e extrair alguma conclusão sobre o assunto. 

O segundo capítulo dedica-se ao estudo da essência humana, avança para o século XIX onde aconteceu a Revolução Industrial, o nascimento de uma sociedade moderna e o surgimento do consumismo. 

O terceiro capítulo dedica-se a narrar o duelo quando duas filosofias opostas em confronto. Desenvolvimento sustentável versus Desenvolvimento econômico, sustentabilidade versus consumismo. Os guerreiros dessa batalha também são estudados nesse capítulo bem como as dificuldades que os modelos de desenvolvimento enfrentam para existir. 

O quarto capítulo dedica-se à publicidade sustentável, novo conceito que vem se solidificando no século XXI. A partir de análises de peças publicitárias é possível comparar e perceber diferenças que talvez espelhem a origem e realidade dos anunciantes que as assumem. 

Qual lado prevalecerá? Otimismo ou pessismo? Não é garantindo que se chegue a uma resposta exata, mas essa busca incitará questionamentos que talvez ajudem a indicar a uma resposta. 

Sociedade moderna norteada pelo desenvolvimento econômico e consumismo 

O homem, assim como todas as espécies vivas do planeta, possui uma tendência natural de evitar situações de ameaça e gastos desnecessários de sua própria energia. Mas a grande diferença é que a raça humana é dotada de inteligência e é capaz de controlar o meio ambiente em prol do seu conforto. Segundo Carlos Gabaglia Penna (1997, p.26), o homem domina o seu grande estorvo, o ambiente cultural, sem nenhuma compaixão. Penna, como muitos outros autores, aponta a Revolução Industrial como grande agente possibilitador para que a humanidade fosse capaz de desenvolver técnicas de fabricação, permitindo diminuir o esforço natural e assim alcançar um estado de conforto de modo facilitado. 

A Revolução Industrial, ocorrida no século XVIII, ditou as novas tendências do mundo, ou seja, lucros maximizados, custos reduzidos, produção acelerada e em grade escala resultando na melhora da fabricação de mercadorias. De acordo com Edouard Goldsmith (1993, p.7) a civilização atual se norteia na crença moderna ao qual afirma que para se maximizar qualquer benefício é necessário maximizar o desenvolvimento econômico. Dessa forma, a visão moderna do mundo impede a assimilação das relações humanas com o mundo e de nos moldarmos a ele. Seguindo essa lógica cientistas ortodoxos acham normal que o mundo esteja doente como conseqüência do triunfo do desenvolvimento econômico. Como se isso fosse um mal necessário. E a grande engrenagem que torna esse sistema possível, é o consumo. Fernando Almeida (2003, p.126) complementa a razão de tal “filosofia”. Ele aponta o fato da cultura ocidental ser fortemente influenciada pelas mais importantes religiões nas Américas e na Europa (judaísmo e cristianismo) onde prega que o homem é o centro de todas as coisas. O mundo foi feito em razão do homem. Na Bíblia Sagrada, temos logo no começo a narração da criação do Universo e da raça humana.

 Assim Deus criou os seres humanos; eles os criou parecidos com Deus. Ele os criou homem e mulher e os abençoou, dizendo: - Tenham muitos e muitos filhos; espalhem-se por toda a terra e a dominem. E tenham poder sobre os peixes do mar, sobre as aves que voam no ar e sobre os animais que se arrastam pelo chão. Para vocês se alimentarem, eu lhes dou todas as plantas que produzem sementes e todas as árvores que dão frutas. Mas, para todos os animais selvagens, para as aves e para os animais que se arrastam pelo chão, dou capim e verduras como alimento. E assim aconteceu. E Deus viu que tudo o que havia feito era muito bom, A noite passou, e veio a manhã. Esse foi o sexto dia. (GN 1:27, 1:28, 1:29, 1:30, 1:31.)

Essa crença leva os ocidentais a aceitar facilmente que seu modo de ver o mundo é moderno, progressista, livre e racional. O modelo de vida ocidental era visto como a verdadeira e correta forma de avanço e tinha pretensões de atingir o mundo inteiro. Hoje pode-se vivenciar o sucesso desse modelo. 

Jean Paul Deléage (1993, p 35) também aponta a revolução industrial juntamente com a colonização mental e material do mundo realizada pelos europeus como fatores que causaram um corte bruto nos laços que o homem manteve com a natureza e com todas as representações que a sociedade tinha concebido. E ainda afirma: “Ao transformar radicalmente o seu meio ambiente, o homem pensou que adquiria para sempre uma autoridade absoluta sobre a biosfera”. O ser humano passou do âmbito coletivo para o individual, novas necessidades surgiram como também a existência da classe média. De acordo com o historiador Fernando Braudel (apud ALMEIDA,2003, p.149) “a revolução industrial teria revolucionado a demanda, constituindo-se numa transformação de desejos”. 

Carlos Gabaglia Penna (1997, p.28) usa de números para ilustrar a explosão do consumo no período do começo da Revolução Industrial. Segundo o autor, a população mundial teve um crescimento de 120%, representação expressiva, mas que se torna tímida quando comparada aos 400% relativo ao crescimento da produção global de bens no mesmo período. A industrialização atingiu diversos países ocasionando um rápido crescimento nas cidades. Com o aumento e a diversificação da produção, a ideologia do conforto foi oficializada e aderida, principalmente, pelas classes mais ricas.

O autor conclui que todo esse processo teve como conseqüência natural o surgimento de uma sociedade consumista, ou como ele próprio denomina, “[...] uma sociedade que faz apologia ao consumo”. ( 1997, p.28) 

Apresentando estatísticas atuais, Fábio Feldmann (2003, p.148) descreve a discrepância entre pobres e ricos em relação ao consumo. Os 20% da população global situados nos países desenvolvidos, somam 86% das despesas de consumo privado enquanto os 20% mais pobres apenas 1,3%. 

Além da desigualdade há o fator cultural que obedece a certos padrões sociais e desejos de consumo por intermédio da ampliação de uma cultura baseada em pesquisas de mercado, solidificando-se através de toda uma gama de produtos tendo como objetivo suprir os desejos e necessidades gerados por uma sociedade que para continuar a existir, é dependente dessa economia. Feldmann ainda completa dando a publicidade o papel de protagonista do consumismo e assim atingido o patamar de uma das principais atividades econômicas do mundo.

A publicidade mostra a sua força quando Feldmann se refere ao automóvel como o maior fenômeno de consumo. No começo do século XIX, Henry Ford implementou o Modelo T e tinha como ideal que cada americano possuísse seu próprio automóvel o que aflorou a competitividade da concorrente General Motors. Essa, por sua vez, estabeleceu a obsolescência planejada no momento que permitia que o consumidor pudesse se dar ao luxo de escolher a cor, o modelo e o ano de seu automóvel, o grande diferencial do Modelo T que pecava pela falta de capacidade de empregar personalidade ao automóvel. Nesse exato momento, o automóvel deixou de ter a função de transportar e passou a significar poder e afirmação social. Ele era um objeto de poder apoiado pela indústria da publicidade. 

Nesse período nasce a cultura do consumo? Para Don Slater (1997, p. 11) a cultura do consumo já existia. Para ele a Revolução do consumidor veio antes da Revolução Industrial. 

Dispondo de mais recursos, por que as pessoas optariam por gastálos em mais coisas? Simplesmente supor uma demanda insaciável por mais mercadoria é supor que uma característica fundamental da cultura do consumo moderna já estaria bem estabelecida. Suas características básicas são dadas e inexplicáveis, e não apenas precedem o capitalismo, mas são de algum modo naturais e eternas. (1997, p.25)

A cultura do consumo foi oficializada na Revolução Industrial por, enfim, atingir proporções globais, por tornar-se massificada. Ela é regularmente redescoberta, editada e apresentada como novo ora para servir de base a propostas políticas, ora como produto acadêmico. O autor ainda afirma que a cultura do consumo não veio como conseqüência da modernização do mundo, mas como um ingrediente dessa receita.

Na medida em que o moderno se estabelece com base em um mundo vivenciada por um agente social que é supostamente livre e racional enquanto indivíduo, dentro de um mundo produzido pela organização racional e pelo saber científico, a figura do consumidor e a experiência do consumismo são ao mesmo tempo típicas do novo mundo e parte integrante de sua construção. (1997, p.18)

O consumidor saiu da esfera do coletivo e social para o individual. Seus motivos pessoais eram o que realmente importava. A cultura do consumo agora pregava “sermos diferentes dos nossos vizinhos” e sempre melhores do que eles. 

Hoje o consumo, logo o consumidor, é a engrenagem que sustenta o modelo de desenvolvimento econômico. Produtos fabricados em grande quantidade precisam ser comprados e, para obter lucros contínuos, esse processo não pode ser finito. Carlos Gabaglia Penna (1997, p.34) afirma que essa condição gerou a sociedade do desperdício ao ponto que os produtos entrassem em obsolescência programada, mas antes fossem tidos como necessários quando expostos pela propaganda. A cada ano novos produtos, novos modelos, nova versão são expostos no mercado, e a publicidade é bem clara em sua mensagem: “Você precisa ter um.” Com todo esse bombardeio apelativo, o consumidor nem se dá conta que essa busca constante pelo novo torna tudo descartável e como o próprio autor comenta: “O desejo de ter leva ao desejo de ter mais.” (1997, p.39). 

Muitas pessoas baseiam o sentido de sua própria identidade no que possuem. A relação entre o “eu” e o “que tenho” é tão confusa que essas pessoas se tornam o que possuem. Isso porque na sociedade moderna o nível de sucesso é equiparado ao consumo de bens materiais e ao poder de posse do indivíduo. Uma competição não formalizada acontece, onde cada um procura ser melhor do que o outro e esse reconhecimento vem em forma de status e bens. É quando o autor denomina que: “[...] riqueza então se torna um fim em si mesma, riqueza essa que não tem um padrão absoluto, mas uma comparação com que os outros possuem.” (1997, p.40). Toda essa procura, traduzida em um consumo constante e crescente é um dos principais motivos da demanda, cada vez maior, de matéria-prima e, como conseqüência direta, o aumento da quantidade de lixo produzido.

A população não é devidamente informada sobre as conseqüências do padrão de vida do homem moderno.Os problemas ecológicos são frequentemente exposto pela mídia( toda a forma de agressão ao meio ambiente), mas a raiz do problema continua nebulosa. A relação de causa e conseqüência não fica muito clara. Para André Trigueiro (2003, p.77), em plena Era da Informação, na Idade Mídia, onde os profissionais da comunicação pertencem ao que se convencionou o Quarto Poder, meio ambiente ainda é uma questão marginalizada pela simples razão de não ter saído do âmbito que ultrapasse a fauna e a flora. A maioria dos cidadãos do mundo relaciona meio ambiente da mesma forma. Mas ao se ter noção do conceito básico de meio ambiente, percebe-se que vai além dessas fronteiras. De acordo com o Novo Dicionário Aurélio, meio ambiente é: “O conjunto de fatores naturais, sociais e culturais que envolvem um indivíduo e com os quais ele interage, influenciando ou sendo influenciado.”

Os problemas ambientais têm projeção que alcançam longos prazos, de 50 a 100 anos, e por isso perdem espaço e importância diante de informações mais imediatas. Isso acontece, segundo o autor, pelo fato de hoje termos uma sociedade cada vez mais imediatista, onde o que vai acontecer daqui a algumas décadas tem cada vez menos importância. 

A publicidade é uma poderosa ferramenta de comunicação, que hoje é utilizada para certificar o sucesso do desenvolvimento econômico. Carlos Gabaglia Penna (1997 p.54) expõe que o propósito da publicidade é estimular a vontade de consumir. Para obter sucesso, os publicitários usufruem do conhecimento científico (estatística, psicologia, sociologia etc.) para manipular o campo dos instintos e emoções humanas. Apesar de a publicidade conseguir alcançar esse campo, só consegue atingir seu objetivo se o consumidor não for capaz de assimilar que, o que lhe é oferecido não passa de um símbolo do seu desejo. Segundo Norval Baitello, o indivíduo se encontra no estado de sedação, ou seja, perde a capacidade de auto avaliar condições e situações se afastando da realidade das coisas.

Hoje existe tanta necessidade a se necessitar que muitas vezes é difícil diferenciar uma necessidade real de uma criada pela publicidade. Cláudio Novaes Pinto Coelho (2003, p.8) acredita que a publicidade é responsável por estabelecer o que se deve desejar, por que se deve desejar e, por fim, mostrar como concretizar esse desejo. Com isso desejamos o que é ofertado pela sociedade capitalista de consumo e sempre ficamos dependentes dela para alcançarmos os nossos desejos. Apesar de termos uma economia de mercado livre, onde cada um deseja e consome o que seu próprio estilo de vida solicita, o autor atenta o fato de que o consumidor só pode desejar o que é fabricado pelos produtores, ou seja, suas necessidades são ditadas por uma gama de produtos já preestabelecidos. 

Os produtos são fabricados em série e em grande escala, mas o discurso publicitário toma o cuidado de singularizar o produto. O consumidor acredita que determinado produto foi desenvolvido especialmente pensando nele e não em um grupo de milhares de consumidores que possuem o mesmo perfil. Como Novaes mesmo descreve: “Embora a sociedade capitalista de consumo seja a mãe de todos, cada um precisa sentir-se como filho único. (2003, p.11) 

O consumo individual é bem visto pelo modelo capitalista de desenvolvimento econômico. Cada indivíduo almeja construir seu próprio mundo, consumir os seus próprios produtos (aqueles feitos especialmente para eles) e cuidar de seus próprios problemas. Mas o mundo concreto, real é apenas um e é nele onde todos vivem. Logo não precisa ser grande conhecedor de números para concluir que um único planeta não suporta demanda de consumo de milhões de planetas individuais.

A publicidade hoje sofre mudanças. No século XXI, devido às alterações ambientais e conseqüências do consumismo, há uma certa cobrança por conscientização. As exigências do novo século, a cada dia se tornam mais severas e impactam diretamente no modo de fazer publicidade. Reinaldo Dias (2006, apresentação IX) afirma que as organizações que adotam ações empresariais ambientalmente responsáveis se destacam aos olhos dos consumidores. Esse fator talvez pudesse impor condições sustentáveis no processo de produção dos produtos impulsionado pela procura de um consumo mais consciente e responsável. Como seria a transição dos modelos de desenvolvimento opostos (desenvolvimento econômico e sustentável)? O impasse do confronto entre consumo e sustentabilidade é a abordagem do próximo capítulo.

Sustentabilidade X Consumismo

Em 1972 aconteceu em Estocolmo, Suécia, a primeira Conferência das Nações Unidas sobre o ambiente humano. O foco do evento girou em torno da discussão sobre as dependências entre o desenvolvimento e o meio ambiente. Segundo Ignacy Sachs (2002, p.48) dois blocos opostos se formaram. 

De um lado os que previam a abundância. Esses priorizavam a aceleração do crescimento e consideravam as preocupações com o meio ambiente desnecessárias principalmente porque alegavam que isso retardaria e intimidaria os esforços dos países em desenvolvimento a alcançar os países de primeiro mundo, com a industrialização avançada. Esse otimismo era defendido por políticos, tanto de esquerda quanto de direita, os quais acreditavam que os efeitos negativos poderiam ser solucionados através de tecnologia garantido assim o progresso material contínuo das sociedades humanas.  

O outro lado era composto pelos catastrofistas. Esses eram extremamente pessimistas em relação ao futuro do planeta. Anunciavam o fim dos tempos caso o consumo não fosse imediatamente paralisado. Para eles a situação era tão grave que o final do século e do mundo poderia ser previsto ou em conseqüência do esgotamento dos recursos ou pelos efeitos da poluição. Alguns deles eram malthusianos, ou seja seguiam a doutrina de Malthus onde se defendia a restrição da espécie humana por motivos de ordem econômica e em defesa da própria humanidade. Acreditavam que a agitação no meio ambiente foi ocasionada pela explosão populacional onde as vontades dos consumidores, a minoria abastada, se sobrepunha à necessidades dos cidadãos, a grande maioria pobre. 

Sachs revela a conclusão do impasse entre essas duas esferas as quais ele denomina como “economicismo arrogante e o fundamentalismo econômico”. O crescimento econômico não poderia ser paralisado, principalmente porque aprofundaria ainda mais os problemas sociais, contudo seu andamento precisaria ser socialmente aceito e executado de forma favorável ao meio ambiente. Oficializa-se um novo conceito: o desenvolvimento sustentável. Desde então vários eventos internacionais de cunho semelhante reforçam a necessidade de mudanças.

Organizações ecológicas surgiram como resposta da sociedade contra as agressões ao meio ambiente e alcançam cada dia mais reconhecimento. De acordo com Reinaldo Dias (2006, p.24) as ONGs desempenham o papel de agentes reguladores cobrando transparência e responsabilidade das empresas. Apesar de serem organizações não governamentais, as ONGs conseguem impor propostas, críticas e até mesmo ações diretas. Muitas enfrentam a falta de recursos financeiros que é compensada por boas doses de criatividade. Dessa forma conseguem atrair os holofotes para questões polêmicas como a exploração predatória dos recursos naturais, poluição dos diversos ambientes do planeta, infração dos direitos humanos etc. 

 As empresas temem as críticas por parte das ONGs porque compreendem o impacto negativo que pode ser agregado às suas imagens. Dias afirma (2006, p.29) que essa nova realidade, um mundo sustentável, cobra nova postura das organizações do setor da economia seja ela privada ou pública, considerando que a opinião pública se atenta cada vez mais às questões ambientais. Muitas empresas buscam associar sua própria imagem à postura ambiental assumida pelas ONGs. Com isso procuram amenizar as pressões externas em defesa da preservação do meio ambiente. Essa aproximação, seja por choque ideológico ou oportunista, possibilita parcerias entre ONGs e empresa proporcionando maiores dimensões e visibilidade aos projetos conjuntos.  

Uma derivação do marketing surgiu para reforçar a sustentabilidade dentro do ambiente interno das empresas. Segundo Reinaldo Dias (2007, introdução X) essa nova faceta é denominada como marketing ambiental, também conhecido como marketing verde, ecológico, sustentável ou ecomarketing. O marketing e suas segmentações, publicidade e propaganda, são vistos como vilões desde a metade do século XX por induzir o consumidor a adquirir o maior número de mercadorias possível. O marketing ambiental assume a função de incentivar produções ecologicamente corretas e promover novos costumes e consumos responsáveis e sustentáveis.

Apesar de existir iniciativas empresariais em prol do meio ambiente, grupos verdes aceitam esses atos com grande receio. O motivo do temor se deve ao fato de que tais ações sustentáveis estimulam, de forma camuflada, ao consumismo mantendo assim, a mesma rotina inconsequente e predatória. Essa preocupação tem justificativa. 

 Segundo Nicolau Sevcenko (2001, p.101), órgãos reguladores e grupos de pressão da sociedade civil não conseguem controlar as ações das grandes corporações que se tornaram o principal agente influenciador das políticas, ciências e tecnologias. Como detêm o poder, suas prioridades passam a ditar as regras no mundo. Como o autor cita, se é descoberto que determinado produto ou procedimento traz malefícios ao meio ambiente ou aos seres vivos, a corporação que vê seu negócio ameaçado ativa seus recursos e financia estudos que vão contra a pesquisa divulgada. O profissional ou grupo responsável pela denúncia é usualmente desmoralizado e o resultado de sua pesquisa, tido como falácia. Vencida mais uma batalha, a corporação ainda utiliza o caso como mote publicitário e busca aprovação de seus atos, de forma negociada, com a mídia e instituições políticas e públicas. Como o próprio autor afirma (2001, p. 101) “Uma vez mais, é uma duelo desigual, como sempre será.” 

O desenvolvimento sustentável como é exposto por Ignacy Sachs (2000, p.35) possui três pilares como base que mediam os impactos, sejam positivos ou negativos, das intervenções humanas no meio ambiente. São eles a viabilidade econômica, critério de relevância social e prudência ecológica. Para encaixar-se nesse conceito, determinado projeto ou processo deve impactar positivamente e simultaneamente nos três âmbitos mediadores. Não adianta ser economicamente e socialmente aceito se causa danos ao meio ambiente, por exemplo. Esse sistema prima pelo bem sócioeconômico-cultural do mundo como um todo. Visando esse fato o autor Reinaldo Dias  (2007, introdução IX) afirma que a produção sustentável assim como o consumo responsável são processos irreversíveis e de força progressiva.

Seguindo a lógica de pensamento abordada acima é fácil imaginar um futuro romântico e idealizado onde há respeito e harmonia entre tudo e todos. Voltamos a pensar que o mundo é regido por um sistema tirano e onipresente que visa o acúmulo de bens e o lucro, enfim o capitalismo. As corporações encontram-se entre as maiores economias do mundo. Assumem a posição mais alta na pirâmide capitalista, acima até mesmo do Estado. A natureza do sistema capitalista é predatória. Segundo Robert Helbroner (1988, p.104) as grandes obras da Economia política reconhecem que: “o processo essencial de acumulação prende-se à capacidade de uma classe capitalista para extrair lucro do sistema.” No capitalismo o acúmulo de riquezas também significa obter poder. E para que um seja muito rico outro deve ser muito pobre, a riqueza de poucos reflete a pobreza de vários. É uma relação inversamente proporcional. Minorias donas do pedaço, ou melhor, do mundo. Aqui se encontra uma situação de confronto. Como as corporações encaram essa nova versão sustentável do mundo norteada por um novo modelo de desenvolvimento com crenças contrárias ao modelo econômico, esse que condiciona e favorece a posição confortável na qual se encontram? Estariam elas dispostas a aceitar o desenvolvimento sustentável sem truques ou trapaças? Responsabilidade social, investimentos em processos e tecnologias sustentáveis, diminuição dos lucros, o que não significa deixar de lucrar. Essas seriam medidas básicas para que o desenvolvimento sustentável seja possível.

Naomi Klein (2002, p.395) apresenta casos que induzem a acreditar em um duelo nada amistoso. A autora expõe uma corporação, conhecida por oferecer atitude e glamour as custas da exploração extrema de seus trabalhadores. A Nike tem sweatshops, traduzido para o português fábrica de suor, espalhadas pelos países mais pobres do planeta. De acordo com a autora, um trabalhador da Nike no Vietnã recebe US$ 1,60 por dia. Esse comportamento explica porque a Nike teve condições de pagar 20 milhões de dólares para o super atleta Michael Jordan ser garoto propaganda do lançamento de seu novo produto, no caso um tênis. Com um custo mínimo de produção a Nike consegue obter dinheiro suficiente para investir pesado em publicidade. A quantia depositada na conta do atleta foi significativamente maior do que a empresa gastou para pagar aos milhares de pessoas que fabricaram os calçados.

 Essa opção da Nike é aceita e justificada por muitos ao se depararem com um mesmo senso comum: “Essa gente é explorada, mas pelo menos possuem um trabalho e uma renda”. Nessa medida observa-se uma ação instrumental por parte da Nike onde a busca por um lucro maior é justificadamente aplicado em publicidade. Em outras palavras a necessidade de ampliar as vendas justifica o modelo de super-exploração dos trabalhadores. A Nike só instala-se em países que lhe garantam mão-de-obra barata e, para isso ser possível, não oferece aos seus trabalhadores garantia ou proteção trabalhista e os direitos humanos são ignorados. É difícil aceitar e sustentar a idéia de que exista tamanho desrespeito e diferença de pagamento ao escolher a mãode-obra na fase de produção quando o caso é melhor ilustrado.

Outro exemplo envolvendo as empresas têxteis foi citado pela Naomi (2002, p.236). Segundo ela, grupos trabalhistas estipularam que um trabalhador de montagem chinês deveria receber no mínimo 0,87 dólares por hora. As multinacionais que possuíam suas fábricas nos EUA e Alemanha pagavam aos seus funcionários uma média de 10 a 18,50 dólares por hora. Mesmo com uma economia significativa ao terceirizar a mão-de-obra na produção, as empresas se recusavam a pagar aos trabalhadores chineses os 87 centavos de dólar que seriam o suficiente para viver com dignidade no país. Naomi (2002, p. 237) afirma em seu livro que:

[...] um estudo feito em 1998 sobre a fabricação de marcas nas zonas econômicas especiais chinesas o qual denunciou as empresas WalMart, a Ralph Lauren, Ann Taylor, Espirit, Liz Claiborne, Kmart, Nike, Adidas, J.C penney e The Limited as quais pagavam não os poucos 87 centavos, mas 13 centavos de dólar por horas os seus trabalhadores chineses. 

Uma coisa é procurar um local que ofereça melhores condições de produção, outra é fazer disso força de exploração. Os trabalhadores chineses são obrigados a ceder aos abusos impostos pelas gigantes que se acomodaram em seu país. A busca de um lucro maior atropelou a responsabilidade social e os direitos humanos. 

O desenvolvimento sustentável não é compatível com o capitalismo que se apega a um único pilar sustentável, a viabilidade econômica.

A sociedade de consumo reverte até mesmo os movimentos contraditórios a seu favor. Ao voltar na historia, Cláudio Novaes Pinto Coelho (2003, p.53) recorda a relação conflituosa entre sociedade de consumo e o movimento hippie. Os hippies eram jovens rebeldes que rejeitavam toda a forma de discriminação, repressão, massificação e consumismo. Além disso, íam contra a todos os valores burgueses. Criticavam a falta de identidade dos jovens representados pela sociedade de consumo como pré-adultos. Assim deviam se vestir, agir e assumir as mesmas aspirações dos adultos. O movimento hippie foi um convite ao jovem para construir, ele mesmo, a própria imagem. Os meios de comunicação se apossaram da causa hippie e a exibiam como desejavam. O movimento não era divulgado de forma boa, logo a imagem do hippie foi associada a drogas, badernas e irresponsabilidade. Mas não impediu a indústria cultural de se especializar nesse novo segmento e inseri-lo na sociedade de consumo. Nasce a moda hippie. Muitos jovens abraçaram a causa ao vê-la exposta na mídia. Como o próprio autor afirma (2003, p.54) “um movimento contra a sociedade de consumo passa a ser divulgado por ela, que começou a produzir bens para os adeptos desse movimento”. Como resultado, o movimento contraculutral ajudou a afirmar o que não queria. Ao defender o desligamento do jovem com a sociedade de consumo, revelou à indústria cultural o seu potencial como consumidor. Houve uma “parasitagem” de valores. O mesmo ocorre com a causa sustentável. O crescente mercado verde foi detectado e os esforço de sedução, voltados a esse público.

Será que a história hoje se repete, mudando apenas o personagem? A revolução sustentável não passará de um novo segmento do mercado com seus valores usurpados, ou a visão romântica de um mundo melhor com a execução do desenvolvimento sustentável se mostrará mais forte? Mais uma vez o confronto de dois lados opostos. A linha que segue o pensamento romântico e a que segue o pensamento burguês. 

Colin Campell ( apudo dicionário inglês Oxford, 2001 p.9), a palavra romântico pode ser definida como: “marcado pelo romance, que inspira ou que a este se dedica; imaginoso, distante da experiência, visionário e (em relação ao método artístico ou literário) que prefere a grandeza ou a paixão, ou a beleza irregular, ao acabamento e às proporções”. Diante a esta definição Campbell (2001, p.9) percebe a incompatibilidade das características empregadas ao romântico em relação ao ato de consumir. O consumo é marcado pela compra e uso de bens e serviços cotidianos, geralmente encarados como atitudes triviais. O autor afirma que por mais que o consumo seja uma maneira de procedimento econômico tornado-se assim o oposto a tudo que é considerado romântico, na verdade não passa de um contraste ilusório. Fica mais perceptivo compreender que romance e o consumo fazem parte do mesmo lado quando se reconhece a existência de um significativo fenômeno moderno que faz ligação direta entre os dois.

Esse fenômeno refere-se a publicidade. Até o mais simples anúncio serve para demonstrar como muitas propagandas utilizam o romance fugindo das experiências rotineiras de cada um e remetendo a inspirações grandiosas e apaixonantes. De acordo com o autor (2001, p.10) não é somente o romance no seu sentido exato que se destaca na associação com os anúncios. 

Os quadros e episódios utilizados são tipicamente “românticos” no sentido mais amplo de serem exóticos, imaginosos e idealizados, ao passo que o verdadeiro objetivo dos anúncios, evidentemente, é o de nos induzir a comprar os produtos postos em destaque ou, em outras palavras, a consumir. 

 O fato de um material de essência romântica ser frequentemente atribuído em propagandas foi notado, e por essa razão o autor afirma que a percepção geral do elo entre romantismo e consumo existe. 

O consumidor movimenta o consumismo, que por sua vez praticamente sustenta o desenvolvimento econômico e o capitalismo, defendido ferozmente pelas corporações que encontram nesses modelos o habitat perfeito para manterem-se fortes, vivas e cada vez mais saudáveis (entende-se por saúde a riqueza). Parece ser uma ótima estratégia sensibilizar o consumidor, informá-lo e conscientizá-lo sobre os impactos negativos que o planeta e todas as formas de vida sofrem atualmente como conseqüência das intervenções humanas no meio ambiente. A partir daí todo um movimento reverso ao desenvolvimento econômico aconteceria iniciando a revolução sustentável. Há um enorme impasse capaz de desanimar talvez até mesmo os ambientalistas mais fervorosos. Os valores do indivíduo se misturam com os valores consumista. Juntos moldam um ser que ao mesmo tempo apóia uma ONG contra o aquecimento global e contribui com o fenômeno climático através de um consumo inconsciente. John Luckács faz uma afirmação que ajuda a entender essa mesclagem.

Os burgueses, outrora, foram os inimigos mortais dos românticos. Ou melhor, eles apenas pareciam sê-lo. Agora sabemos que os românticos eram burgueses, e que os burgueses eram românticos, a um ponto considerável, muito mais do que nós (e, naturalmente, do que eles próprios) estamos acostumados a pensar (apude CAMPELL, 2001, p.283).

Como sensibilizar um indivíduo que renega a visão coletiva preferindo o individualismo e prefere existir, ser notado e reconhecido como um consumidor em potencial? O desenvolvimento sustentável está fadado a ser intitulado como utopia e encontrar consolo no reconhecimento da sustentabilidade como um segmento crescente? De fato a sustentabilidade como um novo nicho ganha importância no mercado. A prova disso é o surgimento da publicidade sustentável, que cada vez mais, faz parte dos cenários urbanos. Aparece como resposta de mudanças aos padrões de vida humana ou de negação à crença sustentável? É sobre esse assunto que o terceiro capítulo se aprofunda.

Publicidade Sustentável

A publicidade reflete a crescente demanda por produtos, ações e produções ecologicamente corretas. Atualmente a publicidade se torna cada vez mais verde. Nesse contexto define-se publicidade sustentável como todo o ato publicitário onde o discurso sustentável é usado como base para incentivar a inserção da sustentabilidade nas ações humanas. 

A sustentabilidade ganha espaço gradativamente em campanhas promocionais, embalagens dos produtos, nos meios de comunicação etc. Ao analisar mais profunda e criticamente as publicidades sustentáveis encontradas hoje, pode-se perceber a existência de uma grande contradição. É comum encontrar publicidade onde o discurso sustentável remete e incita reações opostas de cunho consumista. Isso porque a sustentabilidade é empregada na publicidade, mas nem sempre compreendida. Coincidência ou não a publicidade sustentável tem sua essência dissipada na maioria das ações publicitárias provenientes do âmbito privado. Percebe-se que, principalmente os órgãos não governamentais, preservam o cunho sustentável em suas ações publicitárias. A integridade do tema sustentabilidade é resguardada desde o contato com o conteúdo exposto até a absorção e compreensão da mensagem.  

Esse fenômeno talvez possa ser explicado devido ao fato de que no campo privado, depende-se do resultado das vendas, seja elas por meio de produtos ou serviço. O lucro é preservado, e para atingir o sucesso utiliza-se todos os artifícios afim de atrair o público, mesmo que para isso seja necessário o uso de meias verdades e contradições camufladas. A realidade dos órgãos não governamentais e uma parcela do âmbito público,é diferente. O produto final geralmente oferecido é a conscientização, informação e compreensão de temas relacionados à sustentabilidade. A publicidade nesse caso não precisa ser mascarada, ao passo que explora a sustentabilidade para gerar sustentabilidade. Os exemplos abaixo, acompanhados de análise, ilustram a diferença entre as ações publicitárias verdes.

Campanha de Natal em um shopping, por aí

No Natal de alguns anos atrás, o tal shopping lançou uma campanha promocional ecológica. Cada cliente, ao fazer compras acima de R$100 poderiam desembolsar mais R$20 e adquirir uma bolsa ecológica. Vale salientar que a bolsa foi desenvolvida por uma designer, exclusivamente para a campanha. 

As 5.000 bolsas eram compostas em sua totalidade por algodão. As cooperativas de costureiras de baixa renda das proximidades do shopping, que trabalham em parceria com uma marca de moda que trabalha com bordados manuais, assumiram a confecção. Na decoração do shopping a cor verde foi usada propositalmente e serviu de cenário para a exposição do trabalho de 13 designers da cidade e suas respectivas bolsas ecológicas. Cada lojista do shopping também customizou sua própria bolsa e o público julgaria na escolha da mais bonita.

Segundo um site da ecológico, a gerente de marketing do shopping ainda afirmou: “O consumidor é muito exigente e, para atendê-lo, buscamos uma forma de unir moda e arte com um apelo diferente, no caso, o socioambiental, em função da tendência mundial acerca do tema.” 

Primeiramente para garantir o direito da aquisição de uma das eco-bags era necessário gastar em presentes natalinos. Poderia ser um tênis da Nike, acessórios esportivos da Adidas, perfumes Ralph Lauren entre muitos outros produtos de marcas conhecidas. O brinde ecológico praticamente se apagava diante a tantas embalagens coloridas, plastificadas e descartáveis dedicadas a enobrecer os presentes. O site ecológico, parabenizou a iniciativa pelo “forte cunho social, cultural e motivador. No templo do consumismo a única e verdadeira motivação predominante era a de comprar, comprar e comprar. 

Mais uma reflexão/análise do conteúdo da postagem, e quais mensagens são enviadas ao subconsciente. É incrível como simplificam as soluções em busca de um ambiente mais saudável e sustentável. Parece que tudo resume-se à reciclagem. A reciclagem faz parte dos 3 “erres” referentes ao um consumo consciente, são eles Reduzir, Reutilizar e Reciclar.

Mas, a ordem indica a prioridade das ações. Primeiro o esforço para reduzir, depois ao menos tentar reutilizar o que não pode ser deixado de ser consumido e então reciclar tudo o que não pode ser reutilizado. 

A idéia de reduzir sempre que possível a geração de lixo é a ação mais importante e também mais difícil. Isso implica em um consumo mais consciente e analista onde a importância, quantidade e a relevância dos produtos em nossas vidas são colocadas em questionamento. A noção de reutilizar não está relacionada apenas em dar uma nova utilidade a objetos e embalagens, enfim, coisas concretas. Evitar o desperdício de alimentos, reutilizar a água usada em serviços domésticos também se encaixam nesse entendimento. A reciclagem também é relevante no processo de um consumo mais consciente e é a solução para o que não pode ser reutilizado. Mas a reciclagem é o processo mais complicado de ser executado pois demanda postos de coleta de lixo especializados em recicláveis, conscientização da população na separação do lixo e um meio de mediação entre população e postos firmado.

Os “erres” reduzir e reutilizar muitas vezes, não são mencionados em inúmeras matérias de imprensa, porque logo que interferem diretamente no bolso dos anunciantes de revistas e afins, e bate de frente com os padrões da sociedade de consumo já que remete a compreensão da importância de se comprar menos e melhor. 

Muitos veículosde divulgação de mídia, só parecem explorar um tema sustentável para atrair atenção, já que cada vez mais ganha visibilidade e relevância no cenário mundial. Assim transmite uma falsa atitude de responsabilidade social, mascarando o seu real interesse, o incentivo ao consumismo. 

Desperdício de alimentos

Em 2004, o IBGE, constatou que o percentual de aproximadamente um terço de todos os alimentos consumidos por uma residência, não são devidamente aproveitados. Como se não bastasse, todas as embalagens, o transporte dos alimentos bem como a energia usada na produção também são desperdiçados por conseguinte, impactando o meio ambiente de forma nefasta. A idéia é alertar a população sobre essa questão e incentivar a prática de novos hábitos para mudar essa realidade. 

Uma campanha causou estranheza. Como se o anunciante fosse um supermercado, foi utilizado uma linguagem similar à da publicidade de varejo onde produtos do ramo alimentício eram ofertados, mas em péssimo estado. Um ator representa um funcionário de supermercado e anuncia os seguintes produtos: alface murcha, iogurte vencido, mamão mofado, mexerica passada, maminha estragada, melancia podre e peixe fedido. Depois do término das ofertas, um jingle é cantado pro vozes femininas é feito com o título da campanha, em ritmo de marchinha de carnaval. Para finalizar os 30 segundos da propaganda surge a frase: Você pode reduzir o desperdício, e o verdadeiro anunciante é revelado. Todos os produtos freneticamente anunciados podem ser encontrados no site do youtube.

Um tema sustentável foi abordado onde o discurso e reações provocadas eram harmônicos, ambos remetiam a algo relacionado à sustentabilidade. Uma idéia era oferecida: não ao desperdício. Como o tempo na televisão era relativamente curto, apenas o problema foi abordado. O humor tinha a tarefa de conter a atenção. A estranheza de causar curiosidade e instigar o telespectador em visitar um site e obter mais informações.

No site, havia um link interativo reservado para a campanha. Ao ser selecionado o mesmo ator da versão televisiva recepciona o internauta. Ele faz uma introdução sobre o tema alegando que um terço de tudo que você compra vai direto para o lixo e usa um exemplo para ilustrar melhor a afirmação. Se uma pessoa gastar 100 reais em compras, 30 reais vão direto para o lixo. Depois de chamar a atenção para o bolso ele alertava que esse desperdício influência no aumento de produção de lixo gerado. Por fim conclui que o grande perdedor de todo esse processo é a sociedade.

A tela exibia vários links. Dois deles não eram interativos. Um é dedicado para aquelas pessoas que desejavam, de alguma forma, fazer parte da campanha. Lá o internauta recebia o incentivo de colocar o vídeo da propaganda veiculada na televisão no Myspace, baixar o ringtone e o wallpaper, mandar o MP3 para os amigos, usar a logo da campanha em uma rede social, por exemplo, enfim, em ajudar a propagar a mensagem. O outro era para aqueles que desejavam participar dos fóruns de discussão.

Entre os links interativos existia uma calculadora e um bloquinho de notas. A calculadora gigante chamava a atenção. Ela contabilizava o desperdício baseado em quanto gastava-se em uma compra para abastecer a despensa. O desperdício é exibido em perda de dinheiro por mês, por ano, por cinco anos e por dez anos. O resultado é surpreendente. O bloquinho exibia três opções: me conta mais, mas como posso ajudar? E a sociedade que se dane, tchau!. A cada opção escolhida uma nova explicação seqüencial. Era interessante como o internauta “dialogava” com o ator que representava o feirante. 

Como já foi notado, o “produto” principal era idéia de um consumo consciente. Todas as suas ações, seja qual for a abordagem que envolva a sustentabilidade, remetiam a conscientização da sociedade em repensar sobre seus hábitos e modelo de vida. Aqui encontra-se um genuíno exemplo de publicidade sustentável.

Após a análise das peças publicitárias, outro fator foi percebido. A dificuldade de encontrar a publicidade genuinamente sustentável nas grandes mídias. Instituições não governamentais, geralmente não possuem verba para investir nos veículos mais estratégicos e por isso fazem a sua publicidade de forma mais alternativa principalmente pelo meio virtual. 

 Já para encontrar exemplos de publicidade sustentável com a sua essência deturpada não houve dificuldade. Empresas privadas têm condições para investir em publicidades mascaradas e propagar um consumo nada consciente. Como já citado, a afirmação de Sevcenko: “Uma vez mais, é um duelo desigual, como sempre será.” 

Percebe-se que a publicidade sustentável é totalmente viável para atender os interesses de órgãos não governamentais e empresas do âmbito público. Mas como adaptá-la para o âmbito privado logo que o consumismo sustenta a sua existência? A proposta não é paralisar o consumo, mas torná-lo consciente. Esse é um grande desafio proposto a essa nova versão de se fazer publicidade, mostrar as possibilidades mais sustentáveis capazes de substituir determinadas práticas, sem que para isso seja necessário deixar de consumir. Vendas de carro com incentivo a caronas solidárias, por exemplo. Não é à toa que a criatividade é um grande clichê associado à publicidade.

Conclusão

O tema sustentabilidade exige estudos profundos e complexos por interferir em vários campos de pesquisa e dimensões da vida. O estudo focou-se principalmente nos dilemas que existem entre sustentabilidade e consumismo. A palavra “dilema” já indicava uma busca difícil em encontrar respostas. Como são dois pensamentos opostos, é fácil assimilar que a existência e o sucesso de um, implicam no regresso do outro. A complexidade se encontra em compreender como cada ideologia luta pela sua existência conhecendo como e o que cada modelo de desenvolvimento defende. 

No começo do projeto tinha uma visão não só romântica como inocente. Acreditava que implementar a sustentabilidade no planeta seria um fluxo natural a ser seguido. Não conseguia enxergar que as maneiras de ser sustentável variavam de acordo com a situação e órgãos envolvidos. Se o problema é a falta de recursos oferecidos pelo planeta, por que não exterminar uma parcela da população afim de diminuir a demanda? A proposta é radical, mas não deixa de visar a sustentabilidade. 

Vários outros estudos poderiam dar continuidade e profundidade a esse projeto. A sustentabilidade como oportunidade, seriedade e importância de políticas verdes, relação entre os países desenvolvidos e subdesenvolvidos com a sustentabilidade, enfim temas ricos em conteúdo e que enriqueceriam ainda mais o aprofundamento dessa vertente.

A publicidade assume grande responsabilidade social. Como vimos o consumo não deve ser paralisado e sim consciente. A publicidade é uma ferramenta poderosa que reflete os interesses de que a executa. Portanto, da mesma forma que estimula o consumismo pode propagar um consumo consciente. 

O estudo dos dilemas facilitou a identificação e compreensão do conflito entre dois blocos. Os valores declarados pelo modelo de desenvolvimento econômico defendem basicamente o individualismo; prioridade ao lucro; economia acima do Estado; consolidação de uma sociedade alienada e ignorante. Já os valores declarados pelo modelo de desenvolvimento sustentável exaltam o senso de coletivismo; igualdade entre as esferas econômica, política e social; consumo consciente. 

O modelo sustentável defendido pelos autores citados na pesquisa visa um mundo totalmente harmônico. Retroceder todo o processo atual e mudar os hábitos humanos afim de condicionar a sustentabilidade no planeta além de radical, é inviável no momento. Mas a chama sustentável já está a acessa. Existem grupos e órgãos empenhados em expandir e propagar a sustentabilidade preservando ao máximo sua essência.

Hoje o modelo econômico possui larga vantagem nesse duelo. Privilegia corporações, incentiva o consumismo e sustenta a indústria cultural e a sociedade de consumo. O fato de um lado ser mais forte, pode indicar que esse impasse seja visto mais como um desconforto do que como um duelo. Mas com o crescimento e fortalecimento de uma visão mais consciente e responsável do mundo, essa realidade tem chance de ser transformada. A tendência de que os ideais sustentáveis ganham força a cada dia, projeta a previsão de um nivelamento entre os dois blocos no futuro. A explicação desse fenômeno se deve a relação inversamente proporcional existente entre os dois modelos de desenvolvimento. 

Alcançar a equiparação é um grande passo. Com a igualdade de forças, onde o Estado e a sociedade participam ativamente e conscientemente o duelo pode realmente iniciar-se. Quem sabe o planeta conheça um novo diagnóstico otimista como vencedor? 

Finalmente posso afirmar que minha visão romântica do mundo ainda prevalece, só que agora com um senso crítico mais apurado, sem tanta inocência. 

Essa arte em mosaico é a ilustração da globalização do lixo no planeta Terra.
É o consumo desenfreado - contrário de consumo consciente.