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segunda-feira, 11 de março de 2024

DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: desafios à sua implantação e a possibilidade de minimização dos problemas socioambientais

 O atual momento histórico é caracterizado por problemas que variam desde a disseminação de doenças infecto-contagiosas até a degradação ininterrupta dos recursos naturais. Numa primeira aproximação, os fatores geradores destes problemas aparentam ser muito variados, englobando questões que vão desde aspectos relacionados à economia de uma nação até aspectos alusivos à ética, à moral e à cultura que permeiam a sociedade. 

Sob a égide do capitalismo, em seu estágio atual denominado de globalização, a humanidade, de um modo geral, tem sua vida cada vez mais fundamentada em aspectos ligados à economia. Valores morais, intelectuais e culturais, por exemplo, são deixados de lado no dia-a-dia das pessoas. Atualmente, predomina o pensamento voltado para o aspecto econômico, ou seja, para a produtividade e para o lucro nos processos de produção. Este pensamento acaba repercutindo de forma direta na vida das pessoas, de todas as classes sociais, sendo que as mídias televisa, impressa e virtual impelem os indivíduos a valorizarem a riqueza material e a dimensão individual. 

Problemas de caráter socioambiental como a erosão dos solos, o desmatamento, a poluição e contaminação dos recursos hídricos por resíduos dos mais diversificados e a extinção de espécies da fauna e flora atingem a humanidade de diferentes formas e intensidades. 

Perante esse contexto o artigo propõe-se a discutir a questão do desenvolvimento sustentável, os principais desafios à sua implantação, e evidenciá-lo como uma alternativa possível para a humanidade no sentido de contribuir para a minimização dos problemas socioambientais da atualidade. O texto relaciona a questão do desenvolvimento sustentável com o atual momento histórico, o qual tem características adversas a sua implementação, como, uma concepção de meio ambiente fragmentada, o consumismo e a degradação dos recursos naturais. Estas características acabam influenciando de forma negativa na difusão e implantação do desenvolvimento sustentável nos diferentes segmentos da sociedade, tendo em vista que estão intimamente atreladas ao modo de produção capitalista.

 DESAFIOS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL: A FRAGMENTAÇÃO DO MEIO AMBIENTE, O CONSUMISMO E A DEGRADAÇÃO AMBIENTAL 

A existência humana sobre o planeta Terra sempre dependeu da natureza como um todo. A forma como os diferentes grupos humanos se relacionam com o meio em que vivem muitas vezes não é semelhante. Um exemplo disso são os povos indígenas, tal como os Yanomamis que estabelecem uma relação de harmonia com o ambiente que os cerca, onde estes alteram seu espaço natural o mínimo possível (ROMEIRO, 2003). 

No mundo ocidental, a partir dos preceitos definidos por René Descartes, a natureza é concebida como um recurso, um bem a ser apropriado pelos seres humanos (GIANSANTI, 1998). Assim, a cultura ocidental nos legou uma filosofia que estabelece a dicotomia Homem/Natureza (LUTZENBERGUER, 1977).

Seguindo esta mesma linha de raciocínio, MENDONÇA e LISITA (1997) argumentam que: 

O meio ambiente foi concebido durante muito tempo, de forma genérica, como sendo a ecosfera, da qual o homem faz parte biologicamente e cuja racionalidade/relações sociais, não foi levada em consideração na abordagem dos estudos de caráter ambientalista. Uma tal visão antropocêntrica e antropocentrista, reflexo do cristianismo medieval – que elevou o homem à condição de proprietário da natureza, do modo de produção baseado exclusivamente na reprodução material da sociedade e do cientificismo positivista resultante do Iluminismo, exacerbou a exploração dos recursos naturais e do homem e acirrou a degradação do planeta. 

A concepção de meio ambiente fragmentada e separada do homem, amplificada pelo modo de produção capitalista originou uma profunda degradação dos recursos naturais com conseqüente diminuição em relação à qualidade de vida de diversas sociedades, nas diferentes partes da Terra. 

MORIN (1997) afirma que a educação acabou ensinando as pessoas a separarem e isolarem os fatos. Portanto, existe uma tendência em separar os objetos de seu contexto, ou seja, da realidade que cerca as pessoas como pode ser verificado nas disciplinas escolares e acadêmicas. 

Atualmente, vivemos num contexto marcado pelo produtivismo (GONÇALVES, 2002) e pelo consumismo que é a característica básica da moderna sociedade capitalista (BUARQUE, 1993). O desenvolvimento do modo de produção capitalista operou uma mudança de valores e de ideologia (VESENTINI, 1989), onde a sociedade de consumo e a visão de mundo que a conforma remete a um comprometimento do individual com a lógica de acumulação, que se concretiza na sociedade que para se desenvolver, explora os recursos naturais, degradando-os e exaurindo-os (GUIMARÃES, 2002).

Segundo PENNA (1999) a necessidade humana de valorizar-se e ser respeitado pelos seus semelhantes manifestam-se, de forma crescente, por meio do consumismo e da compra de bens supérfluos.

GIANSANTI (1998) aponta para o fato de que o desejo de ter acesso a produtos de bens de consumo da era microeletrônica vem se ampliando, independentemente da situação socioeconômica das pessoas. Nas sociedades modernas, as pessoas não definem livremente suas reais necessidades, como o saneamento básico e o consumo de alimentos saudáveis, por exemplo, pois existem influências de várias ordens, tais como a propaganda promovida pela mídia televisiva e a vigência de certos padrões de consumo e comportamento. 

Para LEFF (2001) a civilização moderna está fundada no alicerce da racionalidade econômica, ou seja, os homens vivem em função de objetivos atrelados a aspectos econômicos, visando fundamentalmente o lucro. 

A expansão de um modelo de consumo mundial e de um modelo de desenvolvimento fundamentado nos padrões europeu e norte-americano (LUTZENBERGUER, 1977) reforça o uso irracional dos recursos naturais renováveis e não-renováveis (GIANSANTI, 1998) e, conseqüentemente sobre a questão da conservação dos mesmos. 

Nesse sentido, ROMEIRO (2003) pontua que a sustentabilidade do sistema econômico não é possível sem a estabilização dos níveis de consumo per capita de acordo com a capacidade de carga do planeta. Outro aspecto importante que deve ser mencionado é o fato de que as leis que regem a economia e as leis que regem os fenômenos naturais são conflituosas e não possuem consonância (MONTIBELLER-FILHO, 2007). 

É notório que desde o surgimento do homem no planeta Terra, este vem modificando a natureza conforme as suas necessidades biológicas, culturais, econômicas e sociais. Mas a freqüência, bem como a tipologia da degradação ambiental que o planeta vem sofrendo, tem aumentado e diversificado muito (BRANCO, 1989) no decorrer da história da humanidade. 

Casseti (1995) ao apresentar uma discussão sobre as relações homem-natureza e suas implicações, aponta que a degradação ambiental se inicia com a agricultura predatória no continente africano (6.000 a.C.), continua com a ruptura do equilíbrio natural decorrente da substituição da população nômade pela sedentária, nas estepes da Ucrânia e América e intensifica-se com a implantação do modo de produção capitalista (CASSETI, 1995). 

Com a permanente sucessão de técnicas que substituem umas às outras (GONÇALVES, 2002) no decorrer do tempo, tem-se como conseqüência a alteração qualitativa e quantitativa das características originais do ambiente. Para SANTOS (1996) a ciência, a tecnologia e a informação estão na base da produção moderna, da utilização e do funcionamento do espaço, e como conseqüência disso a natureza natural, onde ela ainda existe, tende a recuar, por vezes de maneira brutal. 

Desta forma, Guattari (1995) indica que:

O planeta Terra vive um período de intensas transformações técnico-científicas, em contrapartida das quais engendram-se fenômenos de desequilíbrios ecológicos que, se não forem remediados, no limite, ameaçam a implantação da vida em sua superfície. Paralelamente a tais perturbações, os modos de vida humanos individuais e coletivos evoluem no sentido de uma progressiva deterioração. 

Leff (2001) afirma que a degradação ambiental se manifesta como sintoma de uma crise de civilização, marcada por um modelo de modernidade regido pelo predomínio do desenvolvimento da razão tecnológica sobre a organização da natureza. Nesse sentido, destaca-se o papel desempenhado pelas diferentes tecnologias existentes, que surgiram tendo por finalidade produzir bens que viessem a atender os anseios econômicos dos seres humanos, sem qualquer preocupação com os processos naturais existentes no planeta e, conseqüentemente, com os aspectos ecológicos.

 Perante esse contexto, Montibeller Filho (2007) comenta que a pressão exercida sobre a natureza para a produção de bens que são recursos para o sistema produtivo altera seus processos naturais de funcionamento. Além disso, a pressão ocorre quando é ultrapassada a capacidade de absorção ou de reciclagem natural de resíduos e de rejeitos oriundos das atividades antrópicas de produção e de consumo.

Deve-se menção a idéia de Santos (1996) para o fato de que as técnicas, atualmente, atreladas ao conhecimento científico contribuem de modo eficiente no que se refere à aplicabilidade do conhecimento no dia-a-dia do mundo capitalista. Desta forma, as técnicas são empregadas no meio produtivo visando o lucro e acarretam mudanças no ambiente.

A solução dos problemas socioambientais não é de natureza apenas técnica, mas de uma opção político-cultural, pois afinal, a técnica deve servir à sociedade e não esta ficar subordinada  àquela (GONÇALVES, 2002). Portanto, o problema consiste em como as técnicas e/ou tecnologias são utilizadas pelo ser humano nos diferentes processos de produção (LUTZENBERGUER, 1977).

Destaca-se que todas as sociedades causam algum tipo de degradação ambiental, não importando sua condição socioeconômica, bem como o local onde se situam, ou seja, no meio urbano ou no meio rural a degradação existe de acordo com a forma e a intensidade das atividades realizadas. 

Na Agenda 21, resultado da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro em 1992, existem diversas discussões e possíveis soluções para os problemas ambientais em nível global. Sobre a degradação ambiental consta neste documento que: “A pobreza e a degradação do meio ambiente estão intimamente relacionadas. Enquanto a pobreza tem como resultado determinados tipos de pressão ambiental, os principais fatores geradores da deterioração ininterrupta do meio ambiente mundial são os padrões insustentáveis de consumo e produção, especialmente nos países industrializados” (AGENDA 21, 2001). 

Depreende-se desta citação que a degradação ambiental é causada por diferentes classes sociais. Porém, as pessoas com baixo poder aquisitivo não possuem a mesma capacidade de causá-la como as grandes corporações econômicas e mesmo quando comparadas com pessoas em situação econômica oposta e com maior facilidade de produzir e consumir bens materiais e, de gerar resíduos. 

Autores como CAPRA (1997), SANTOS (1997), LEFF (2001) e MORIN e KERN (2003), apontam que a idéia de progresso fundamentada na tecno-ciência é a responsável pelo atual estágio de degradação ambiental vista no planeta. 

O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL COMO UMA POSSIBILIDADE DE MINIMIZAÇÃO DOS PROBLEMAS SOCIOAMBIENTAIS DA ATUALIDADE 

CÂMARA e SANTOS (2002) comentam que entre as décadas de 1960 e 1980 os padrões de produção e consumo adotados pela sociedade acarretaram visíveis problemas no que concerne à deterioração das dimensões ambiental, cultural, social e econômica tendo como conseqüência direta, a perda na qualidade de vida das populações. 

Em período concomitante um conjunto de intelectuais de diferentes correntes teóricas externalizaram seu pensamento sobre a crise ambiental realizando uma crítica contundente ao desenvolvimento técnico. Mesmo divulgado com relativo fôlego em nível mundial, a humanidade continuou trilhando seu caminho sem dar a devida atenção para tais idéias chegando até a atualidade, onde diversos problemas socioambientais afligem a mesma, de diferentes formas e intensidades. 

Santos (2004) comenta que o desenvolvimento sustentável possui suas raízes na década de 1950, foi difundido em 1970 e oficializado em 1987 no documento denominado Relatório Brundtland, num contexto marcado por diversos problemas ambientais advindos de atos de irresponsabilidade e de falta de planejamento em diversas partes do planeta. 

Atualmente, a implementação de ações objetivas tem sido muito lenta, em grande parte devido à complexidade do cenário multifacetado dos países, ao desequilíbrio das organizações institucionais do mundo e aos interesses políticos e econômicos (REIS, FADIGAS e CARVALHO, 2005) das grandes corporações dos setores produtivos que acabam sobrepondo-se aos interesses socioambientais coletivos. 

O desenvolvimento sustentável apresenta-se como um projeto destinado a erradicar a pobreza, satisfazer as necessidades básicas, melhorar a qualidade de vida da população e promover a conservação ambiental. Constitui-se num projeto social e político que aponta para o ordenamento ecológico e a descentralização territorial da produção, assim como para a diversificação dos tipos de desenvolvimento e dos modos de vida das populações que habitam o planeta (LEFF, 2001).

No tocante à exploração dos recursos naturais, o ser humano utiliza-se de um enfoque linear, utilizando, processando e modificando os recursos com a finalidade de produzir e consumir. Nesse sentido, o paradigma do desenvolvimento sustentável procura estabelecer padrões de produção e consumo atrelados aos processos de recuperação ambiental (MOTA, 2000). 

ROMEIRO (2003) comenta que é necessário criar condições socioeconômicas, institucionais e culturais que estimulem não apenas um rápido crescimento tecnológico, poupador de recursos naturais, mas também uma alteração no sentido dos padrões de consumo que não acarretem o crescimento contínuo e ilimitado do uso de recursos naturais per capita. Para o autor supracitado, a estabilização dos níveis de consumo per capita pressupõe uma mudança de atitude, de valores, que contraria a lógica prevalecente, a da acumulação de capital. 

O desenvolvimento sustentável prevê a educação ambiental como instrumento de melhoria da qualidade de vida, por meio da formação de cidadãos conscientes de sua participação local no contexto da conservação ambiental global (HAMMES, 2004).

Para tanto, necessário se faz uma profunda reflexão sobre a verdadeira função da educação* nas escolas brasileiras, inclusive com uma revisão de seu arcabouço legal, onde este estimula, de forma mascarada, a formação de cidadãos pouco capazes em refletir sobre sua situação social, econômica, cultural e como é a qualidade do ambiente que os cerca (MENEGUZZO, 2007). 

ALMEIDA (2002) comenta que no paradigma da sustentabilidade ambiental a atividade econômica, por exemplo, não pode ser pensada ou praticada em separado das questões ambiental, social, política, cultural e educacional. A sustentabilidade ambiental possui, portanto, um caráter holístico, onde homem e meio ambiente estão integrados não estabelecendo, portanto a dicotomia Homem/Natureza. 

Para o autor supracitado, o debate em relação ao desenvolvimento sustentável hoje está polarizado entre duas concepções: de um lado, a idéia sendo gerida na esfera da economia, e desta maneira, incorpora-se a natureza, à cadeia de produção (a natureza passa a ser um bem de capital); de outro, a idéia que tenta quebrar com a hegemonia do discurso econômico e a expansão desmesurada da esfera econômica, indo para além da visão instrumental. 

BRÜGGER (2004) argumenta que o conceito de desenvolvimento sustentável comumente apresentado na literatura possui consonância com a ideologia vigente do sistema capitalista. Depreende-se, portanto, que o mesmo não atinge a “raiz” do problema, ou seja, não provoca mudanças na estrutura produtiva, nem na qualidade de vida das pessoas. 

Montibeller Filho (2007) indica que o desenvolvimento sustentável tem sido efetivado em atividades empresariais apenas no sentido de buscar a sustentabilidade do ambiente físico, não contemplando, portanto, as outras dimensões (cultural, educacional e política, por exemplo) que constituem sua razão de ser. 

CONCLUSÕES 

A humanidade encontra-se num determinado estágio de evolução das técnicas onde as mesmas não irão deixar de existir para fins exclusivamente socioambientais. Novas técnicas deverão aparecer no cenário global para que, problemas dos mais diversificados possam ser minimizados e/ou solucionados, tendo em vista a atual situação de degradação ambiental vista nas diferentes partes do planeta Terra. 

* É comum a ocorrência de educandos desprovidos de condições básicas para sua permanência na escola. Como exemplo pode-se citar a existência de jovens que vão para as escolas com o intuito de apenas alimentar-se na hora do recreio.

 O modo de produção capitalista aliado à visão linear em relação à exploração e ao uso dos recursos naturais acarreta uma alteração de valores nas pessoas que, por sua vez, acabam tendo um comportamento de alienação em relação ao meio ambiente. 

A visão antropocêntrica, estritamente relacionada ao modo de produção capitalista deveria ser substituída por uma visão biocêntrica, fundamentada nos aspectos ecológicos (MORIN & KERN, 2003) que são de vital importância para a manutenção do equilíbrio ambiental e, conseqüentemente, base para a sustentação da vida dos seres humanos. Embora predomine no pensamento moderno a idéia de que o homem é parte constituinte da natureza, esta concepção está longe de ser única (AZEVEDO, 2002). No contexto atual, há a necessidade de uma concepção de meio ambiente atrelada à idéia de que a humanidade faz parte de um sistema vivo, no caso o planeta Terra. 

Representados de diferentes formas e intensidades os processos de degradação ambiental provavelmente nunca deixarão de existir. Cabe, neste caso, utilizar-se do conceito de desenvolvimento sustentável, do instrumental técnico concebido nos diferentes campos do conhecimento que constituem o arcabouço das ciências ambientais e da legislação ambiental vigente para que tais processos sejam sempre o menos degradante possível.

A forma como a educação, por exemplo, enfrenta o atual contexto socioambiental, só vem perpetuando os valores da sociedade industrial. A humanidade necessita de uma mudança epistemológica nos conceitos de meio ambiente, ciência, tecnologia e educação (BRÜGGER, 2004). 

O desenvolvimento sustentável deve ser aplicado nos processos produtivos, tais como em atividades do setor primário e secundário da economia, divulgado e trabalhado nos diferentes segmentos da sociedade e nos diversos níveis de ensino, público e privado, visando atender padrões mínimos de qualidade de vida e de conservação dos recursos naturais. O mesmo deve ser visto como um meio para se atingir determinados objetivos, não como um fim em si mesmo, capaz de resolver a totalidade dos problemas socioambientais. 

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